domingo, 30 de setembro de 2012

Quantas vezes deixei de tentar mais uma vez?


Monet, Impressão, nascer do sol, 1872

Desistir... eu já pensei seriamente nisso, mas nunca me levei realmente a sério; é que tem mais chão nos meus olhos do que o cansaço nas minhas pernas, mais esperança nos meus passos, do que tristeza nos meus ombros, mais estrada no meu coração do que medo na minha cabeça.

(Cora Coralina)




Me lembro, como se fosse hoje, de uma situação ocorrida quando eu tinha 7 anos. 
Minha avó materna tinha por hábito visitar o túmulo do meu avô todos os meses, levava flores, acendia velas, era como se fosse um ritual para ela. O cemitério ficava a certa distância da nossa casa e, se hoje o transporte público é deficiente, dá para imaginar o transtorno que era se deslocar por meio dele há quase 35 anos atrás. Sendo assim, minha avó fazia todo o trajeto a pé e, religiosamente, me levava junto com ela. 
Naquele dia que estou a recordar, fazia um sol escaldante, fomos e voltamos sem nenhuma nuvem no céu que pudesse bloquear, por alguns minutos, ou segundos que fossem, os raios solares que, literalmente, cozinhavam nossa pele.
Chegamos em casa no momento em que minha mãe estava fazendo o almoço e, na pia, lavava folhas de agrião para preparar uma salada. Eu me aproximei, peguei uma delas, amacei entre os dedos e aspirei o aroma do suco que se formou em minha mão. 
No final da tarde, comecei a me sentir muito mal, tive febre alta, calafrios e dores pelo corpo. Minha mãe, preocupada, me levou ao hospital, onde foi diagnosticado uma insolação. 
Porém, na minha mente de criança, não foi o sol escaldante, sem proteção alguma, o responsável pela enfermidade que me acometeu. Na verdade, ficou registrado na minha lembrança, que foi o cheiro do sumo do agrião que me fez tanto mal, mas tanto mal, que acabei tendo de ser hospitalizada.
Daquele dia, até hoje, nunca mais consegui comer agrião. Não posso nem com o cheiro, pois, quando sinto, sou tomada por náuseas e todo o mal estar que senti na ocasião parece retornar, nitidamente, ao meu corpo. Assim, quando me perguntam se gosto de vegetais, sempre respondo: gosto de todos, exceto, de agrião.
Meu objetivo, ao narrar essa pequena parte de minhas memórias, é enfocar o quanto uma convicção errônea pode nos causar prejuízos nas mais variadas esferas da vida. 
É comum ouvirmos, muitas vezes de nós próprios a seguinte fala: tentei uma vez, não deu certo, não vou nem tentar novamente, pois já sei qual será o resultado. 
Com essa atitude, estamos determinando que algo dará errado, sem nem mesmo termos ousado realizá-lo, sem buscar ver onde foi que erramos na primeira tentativa, a fim de readequar os parâmetros para uma nova experiência que, se não for ao menos colocada em prática, não há como saber se teria dado certo ou não.
Todavia, muitas vezes temos consciência disso, de forma até mesmo contundente, entretanto, preferimos deixar a razão de escanteio e nos lançarmos a teorias mirabolantes, atribuindo a fatores, muitas vezes inexistentes, a razão da nossa desistência.
Isso é inerente à personalidade humana, todavia, podemos, muito bem, lidar com isso de forma racional, ultrapassando as barreiras lançadas, por nós mesmos, em meio ao nosso trajeto rumo aos projetos que deixamos relegados ao acaso, apenas pela falta de coragem de tentar novamente.
A história que narrei no início da postagem é apenas uma, dentre tantas outras, que me estancaram e me impediram de alcançar algumas metas de vida e, acreditem, não mais comer agrião é a menor das minhas perdas por não ter tido a coragem de tentar mais uma vez.

Um beijo grande!


P.S.: O termo impressionismo surgiu devido a um dos primeiros quadros de Monet, Impressão, nascer do sol (obra, cuja imagem aparece na abertura dessa postagem), quando de uma crítica feita ao quadro pelo pintor e escritor Louis Leroy: "Impressão, nascer do Sol – eu bem o sabia! Pensava eu, justamente, se estou impressionado é porque há lá uma impressão. E que liberdade, que suavidade de pincel! Um papel de parede é mais elaborado que esta cena marinha". A expressão foi usada originalmente de forma pejorativa, mas, Monet e seus colegas, não desistiram e adotaram o título, sabendo da revolução que estavam iniciando na pintura.


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