quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Um novo grito de revolta!



Devo dizer, com todas as letras, que estou profundamente revoltada com o teor do Programa Bem Estar, veiculado na manhã de hoje pela Rede Globo de Televisão. Aliás, a revolta não é apenas minha, tenho absoluta certeza, mas é de todos que convivem diariamente com a Esclerose Múltipla e sentem na própria pele o que é carregá-la como bagagem.
Sou da opinião que programas assim não acrescentam nada na desmistificação da doença autoimune, muito pelo contrário, eles apenas conseguem fazer com que os leigos ou os menos desavisados acreditem que não é tão difícil ser esclerosado como nós demonstramos, pois, é muito bonito de se ver os portadores que não tem sequelas, que levam uma vida, no dizer deles, absolutamente "normal", chegando a dizer que nem se lembram de ter Esclerose Múltipla. 
Agora a pergunta: como não lembrar de ser portador de uma doença progressiva e incurável que nos obriga a tomar medicação contínua, a fazer diversas terapias e a ficar refém da sua imprevisibilidade?
A verdade tem de ser dita! No Brasil estima-se somos cerca de 35 mil portadores, destes quantos conseguem praticar esportes mais radicais? Quantos conseguem ter um dia inteiro de atividades sem chegar ao fim do dia exauridos pela fadiga? Quantos não sentem desequilíbrios, vertigens, formigamentos, dores, dificuldades cognitivas, descontroles urinários e intestinais, fraquezas e rigidez musculares, alteração de visão e outros sintomas que a enfermidade provoca?
Na verdade, eu desconheço quem é esclerosado e não se queixe de nenhum desses sintomas em um ou outro momento, sem contar quando dos surtos em que eles se agudizam e nos obrigam a ser bombardeados por corticóides.
Por que, então, não se mostrar os esclerosados que andam com dificuldade ou que estão em cadeira de rodas, ou que não podem mais levar a vida "normal" como foi afirmado no programa? Seria uma forma de mostrar que pensamento positivo e se manter o mais ativo possível pode retardar os efeitos da doença? Talvez essa seja a finalidade de programas assim? Se for, de pronto já manifesto minha discordância, pois, mesmo os que não podem mais andar, ou que perderam quase toda a visão, ou que a fala está arrastada, ou que tem alguma função comprometida ou, como eu e milhares de outros, tem a fadiga como o pior dos sintomas, o que nos impossibilita de subir alguns degraus sem ficar sem forças até pra falar, será que também não temos atitudes positivas diante da vida? Será que não somos dignos de demonstrar que mesmo sendo terrível ser esclerosado, nós vamos tentando nos apoiar e viver o melhor possível dentro do que nos é possível viver?
Eu me revolto, eu me insurjo contra esse tipo de abordagem, pois no momento que o programa foi ao ar, telefones não pararam de tocar, mensagens não pararam de chegar e pessoas, até que bem intencionadas, mas profundamente mal informadas, questionaram nossos tratamentos, a competência dos nossos neurologistas e a veracidade das nossas dificuldades e sintomas. 
Sei que não estou sozinha na minha revolta, por isso, solicito a todos que sentiram o mesmo, que subscrevam este meu mais novo grito de revolta para que juntos possamos nos dar voz, exigindo respeito pelas nossas dificuldades, e que a Esclerose Múltipla possa ser abordada em todas as suas faces e não apenas naquelas que fazem de nós, a maioria que não consegue mais se equilibrar ou executar suas tarefas como antes, sermos vistos como exceção.
Nós somos a maioria e merecemos respeito!




segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Apenas respeite...

Fonte: Google imagens




Custamos a respeitar as dores invisíveis, para as quais não existem prontos-socorros. Não adianta soprar que não passa.

(Martha Medeiros)







É engraçado como todos têm uma receita infalível de cura para nossas doenças, principalmente para aquelas que não se enxergam a olho nu. 
Quando nos vemos acometidos por males que nos enfraquecem emocionalmente e fisicamente somos bombardeados com palavras, muitas vezes bem intencionadas até, de que devemos agir dessa ou daquela maneira, de que devemos nos levantar porque ficarmos muito tempo deitados não é bom, de que devemos reagir, de que devemos parar de dramas, de que devemos ser fortes, de que devemos tomar tal chá ou remédio que foi bom para alguém que também estava como nós, de que não devemos nos preocupar com coisas que não tem como não nos preocupar e por ai vai.
Confesso que isso não é nada agradável, uma vez que se fosse algo que dependesse apenas da nossa força de vontade, com certeza nem teríamos adoecido, mesmo porque, me digam, quem em sã consciência quer contrair qualquer tipo de enfermidade? Quem quer se ver prostrado em uma cama sem forças até para falar? Quem busca para si sentir dores e toda gama de sintomas que as doenças nos provocam?
Então, embora muitos cavem doenças para si, quando se entregam a vícios e vidas completamente desregradas, eu estou falando aqui das pessoas que fazem de tudo para viver o melhor possível e, mesmo assim, são acometidas por fatalidades que as relegam a doenças, algumas transitórias, outras incuráveis, mas todas, de algum modo, provocam sofrimentos imensuráveis pelos que nunca viveram nada parecido.
Ter de justificar a própria doença é exaustivo. Ter de explicar que não é falta de força, otimismo ou vontade é desgastante. Ter de se violentar para não demonstrar fraqueza para os que nos cobram coragem é desalentador. Nada disso colabora para nossa cura, nada disso nos fortalece, nada disso nos faz sentir melhores. Pelo contrário, isso apenas nos deixa profundamente decepcionados por ver que nossos sofrimentos são minimizados e, muitas vezes, menosprezados por aqueles de quem esperávamos apoio e compreensão. 
Não precisamos de receitas mirabolantes de cura, pois já estamos buscando a cura quando nos submetemos, por conta própria, a tratamentos físicos e emocionais, quando não nos recusamos a usar os medicamentos receitados por profissionais qualificados, quando nos esforçamos para superar dia-a-dia nossas enfermidades.
Porém, o que precisamos, de verdade, é que nossas enfermidades sejam olhadas com respeito, mesmo quando elas não sangrarem, mesmo quando elas não deixarem expostas feridas em nosso corpo, mesmo quando elas não forem passíveis de serem vistas apenas com um simples olhar.
Não queremos piedade, não queremos discursos de auto ajuda, não queremos comparações... queremos apenas compreensão, apoio e respeito, pois um simples gesto de atenção, carinho e entendimento, pode nos levar à cura, senão à cura completa, ao menos à cura dos sintomas que nos levaram além do limite das nossas forças.
Não estamos doentes porque queremos, estamos doentes porque fomos vítimas de uma fatalidade da vida e todos, sem distinção, poderão passar um dia pelo mesmo, infelizmente. Portanto, nunca cobre força de quem está dando tudo de si para sair do buraco em que mergulhou, mas estenda sua mão e o ajude a sair de lá.

Beijos na alma!


quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Às vezes, tenho medo...

Fonte; Google imagens


O medo faz parte da vida da gente. Algumas pessoas não sabem como enfrentá-lo, outras - acho que estou entre elas - aprendem a conviver com ele e o encaram não como uma coisa negativa, mas como um sentimento de autopreservação.

(Ayrton Senna)




"Sinceramente, eu não entendo porque você tem medo de ficar inválida por conta da Esclerose Múltipla, sendo que qualquer pessoa, mesmo saudável, também pode ficar a qualquer momento.". 
Eu ouvi essa fala de uma amigo, não esclerosado, quando lhe disse que não estava muito bem estes dias pelo fato de que estar há quase 6 semanas de cama, me recuperando da fratura no tornozelo e, por não ter força na outra perna, ter muitos desequilíbrios, o médico determinou que eu me locomovesse o mínimo possível, o que me torna completamente dependente, tem tornado inevitável que eu sinta medo de ficar dependente fisicamente no futuro.
No momento em que ele me disse isso, eu me calei, desconversei, porque percebi que qualquer argumento meu seria rebatido com discursos de que tenho de pensar positivo, ser otimista, ter fé, porque comigo, com certeza, não irá acontecer nada, porque até mesmo ele, que me conhece bem, não consegue ver que eu tenho uma doença grave, de tão "normal" que eu pareço ser quando olham para mim. Eu me calei, desconversei, porque tem dias que ouvir essas palavras, mesmo que ditas com boa intenção, na tentativa de me animar, dói muito, pois sinto toda a gama de emoções, sintomas, dores, dificuldades que eu enfrento carregando a Esclerose Múltipla dependurada em mim, serem menosprezadas, serem diminuídas em toda sua dimensão, quando o que eu precisava, para me sentir mais forte, era apenas um "eu te entendo e estou aqui para te ouvir se quiser falar a respeito". Isso me bastava, isso  minimizaria meus medos, isso me fortaleceria.
Mas, como explicar para alguém que não consegue nem vislumbrar o que significa sentir suas pernas perdendo força, dia-a-dia, que é inevitável que, em certos momentos, o medo se torne mais latente?
Como dizer que você não faz do medo o norte da sua vida, mas que ele te ronda, te espreita quando te sente mais frágil?
Eu pensei, pensei muito, e apenas quero dizer que, realmente, qualquer pessoa, por mais saudável que seja, em um dia qualquer, pode cair da escada, pode ser atropelada por um caminhão, pode sofrer um acidente de carro, ou de moto, ou despencar de um andaime, ou do topo de um prédio, ou ser atingido por um objeto qualquer e se tornar inválido. Porém, nenhuma pessoa que não viva acompanhada por uma doença potencialmente degenerativa e incurável, acorda  pensando que aquele pode ser seu último dia de independência física.
Eu não tenho medo todos os dias... mas quando minhas pernas falham, meus braços cansam e comer se torna algo complexo, quem dirá lavar os próprios cabelos, sentir medo se torna inevitável e o que eu preciso, nesses momentos, é de respeito e apoio, apenas isso, nada mais.

Beijos na alma!


quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Quero minha energia de volta...

Fonte: Google imagens


Eu dou um pedaço de mim, em todos os sentidos da palavra, quando faço qualquer coisa.


(Christine Miserandino, autora da Teoria da Colher)





Uma amiga me enviou um texto, escrito por uma portadora de lúpus, intitulado de Teoria da colher, e eu me vi em cada uma das palavras escritas, assim como tenho certeza, muitos companheiros de enfermidade, se verão nelas também.
Eu estou há exatos 35 dias de repouso, me alternando entre sentar e deitar, deitar e sentar, por conta da fratura no tornozelo e, pode parecer inacreditável para quem não sabe como é viver esclerosada, mas hoje me sinto como se tivesse dado a volta ao mundo correndo e a pé, tal a falta de energia que me acometeu, tal a fadiga que está me consumindo, tal o cansaço que tomou conta de mim por estar me sentindo tão mal.
Minha cabeça dói, minhas articulações doem, meus músculos doem, meus olhos doem, minhas unhas doem, meus pensamentos doem... minha respiração está difícil, minha fala está arrastada, meu campo de visão está diminuído, meus pensamentos embaralhados, as palavras fogem e, tentar recuperá-las de volta, é um esforço excessivo que me exige um gasto energético maior do que eu tenho para dispor.
Hoje, não estou apenas fadigada, mas também estou cansada de me sentir assim e, a minha válvula de escape, as lágrimas, não estou podendo usar, porque descobri que chorar faz meus olhos quererem pular para fora das órbitas e a dor é quase insuportável. Então, chorar está fora de cogitação e estou tendo de dispender minha última colher,  ou seja, minha última centelha de energia para conter o choro que está querendo rolar insistentemente.
Estou cansada...estou exausta... estou exaurida.... estou fadigada... estou prostrada... estou esgotada...
Eu quero minha energia de volta... quero mais colheres, mas, elas acabaram...

Beijos fadigados...


P.S.: para ler a Terapia da colherclique aqui.


terça-feira, 7 de outubro de 2014

Sinal de humanidade...

Fonte: Google Imagens





Você tem que dizer aquilo que está sentindo quando realmente estiver sentindo.

(Taylor Swift)








Por que será que é tão difícil  acreditar naquilo que os olhos não podem ver?
Por que será que que olhares incrédulos pousam naqueles que sofrem de patologias que não sangram?
Por qual motivo temos de viver justificando aquilo que sentimos intensamente, mas que nosso corpo não mostra a olho nu?
Tenho andado farta de precisar justificar a minha fadiga, as minhas dores, fraquezas musculares, choques, espasticidades, medo, impotência...
Eu tenho Esclerose Múltipla, uma doença imprevisível e muitas vezes invisível, preciso justificar mais????
Outro ponto que me exaure é me ver constantemente bombardeada com comentários do tipo: você tem de ser mais otimista! Você precisa ter fé! Você precisa ser menos negativa! Você não pode se lamentar! Como se o fato de ser realista, encarar de frente e ter coragem de assumir o peso e todas as dificuldades que a doença neurológica me traz fossem sinônimos de pessimismo e lamentação!
Eu e todos os seres humanos temos o direito de expormos nossos medos, incertezas, dores, angústias, sem que sejamos tachados de pessimistas, descrentes ou de pessoas que só sabem se lamentar da vida, uma vez que uma coisa é você conseguir colocar para fora todos os seus dramas interiores e, outra, é você se deixar dominar pela doença sem ao menos esboçar uma reação.
A Esclerose Múltipla não me domina, mas ela me limita em muitas coisas sim! Não tenho como negar isso. Não dá para dizer que eu levo uma vida absolutamente normal. Ela mudou e muito minha vida e isso é inevitável que aconteça quando somos acometidos por uma enfermidade que nos provoca, mesmo que invisivelmente, tantos sintomas físicos e emocionais. 
Como negar que você se levantar da cama mais cansado do que quando foi se deitar te deixa incapaz de realizar tantas coisas que tinha planejado no dia anterior? Como dizer que sentir dores que analgésicos não abrandam não tira seu bom humor e te deixa com a tolerância diminuída na maioria das vezes? Como não assumir que sentir o corpo não obedecer aos comandos do cérebro provoca uma inevitável impotência?
Talvez muitos dirão que basta ser muito forte e tudo isso pode ser superado com fé e otimismo. Eu não discordo que a força realmente nos impulsiona e não nos deixa desistir, mas ninguém, por mais saudável e forte que seja, consegue ser forte o tempo todo. Aliás, ninguém precisa ser forte o tempo inteiro, pois todos, mas todos mesmo, vivem seus momentos de desalento, tristeza, impotência, angústia e solidão e, isso, nem de longe é sinal de fraqueza, mas muito pelo contrário, isso é, apenas e tão somente, sinal de humanidade.

Beijos humanos no coração de todos!