Bete Tezine, Autorretrato, 2012. Bordado sobre fotografia, 35 x 45 cm. |
Quando olho meu retrato o que vejo?
Viajo nas lembranças de um tempo,
reminiscências perdidas, fugazes
que ficaram lá atrás, não voltam.
Olho um retrato que não retrata minha alma
apenas registra uma triste calma
de alguém que não viveu tudo que queria
[...]
(Retrato da minha alma, Suelydam)
Sempre tive repulsa por ser fotografada,
fujo das câmaras o máximo que posso, sendo que as imagens que me refletem são
aquelas das quais não tenho como fugir, ou aquelas sobre as quais não tenho
controle.
Talvez,
as reflexões do personagem de Luigi Pirandello, Vitangelo Moscarda, protagonista de Uno, nessuno e centomila, traduzam as minhas inquietações ao
contemplar minha imagem em um retrato fotográfico:
Se,
para os outros, eu não era aquele que, até agora, acreditara ser para mim, quem
eu era?
Vivendo, nunca tinha pensado na forma do meu nariz; no
corte, se pequeno ou grande, ou na cor dos meus olhos; na estreiteza ou na
amplidão da minha testa, e assim por diante. Aquele era o meu nariz, aqueles os
meus olhos, aquela a minha testa: coisas inseparáveis de mim, nas quais, levado
por meus negócios, tomado por minhas ideias, entregue a meus sentimentos, não
podia pensar.
Mas agora pensava:
E os outros? Os outros não estão dentro de mim.
Para os outros que olham de fora, minhas ideias, meus sentimentos possuem um
nariz. Meu nariz. E possuem um par de olhos, meus olhos que eu não vejo e que eles
veem. Que relação existe entre minhas ideias e meu nariz? Para mim, nenhuma. Eu
não penso com o nariz, nem me ocupo com o nariz, quando penso. Mas os outros?
Os outros que não podem ver dentro de mim minhas ideias e veem de fora o meu
nariz? Para os outros as minhas ideias e o meu nariz têm tanta relação, que se
aquelas, digamos, fossem muito sérias e este por sua forma muito esquisito,
começariam a rir.
Devo dizer que, ao ser fotografada, eu me sinto,
de certa forma, como os índios de algumas tribos que não se permitem ser
fotografados por acreditarem que terão a alma roubada. Sinto-me violada na
imagem que tenho de mim que, de forma alguma, é compatível com a imagem refletida
na fotografia.
Assim, por bem poucas vezes me permiti ser
fotografada, foram poucas as vezes em que posei para a câmera fotográfica, nunca
espontaneamente, mas apenas no cumprimento de alguma obrigação social ou por
imposição legal (fotos 3x4 para documentos).
Talvez, seja tudo isso o que sustenta essa minha
aversão a ser fotografada; talvez seja um conflito interior que se instalou,
inconscientemente, em algum momento do início da minha existência ou, talvez,
seja um conjunto de todos esses fatores. Porém, chega um momento da vida em que
somos obrigados a enfrentar certos traumas e, para mim, esse momento chegou em
forma de uma enfermidade, a Escleros Múltipla.
Um beijo carinhoso!
P.S.: O texto dessa postagem é um trecho da monografia do meu TCC - Trabalho de Conclusão de Curso, da graduação em Artes Plásticas, cujo tema foi Autorretrato.
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