sábado, 15 de setembro de 2012

Manifesto contra a ditadura da constante felicidade


Constituição Federal/1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença 


Há tempos, tenho andado incomodada com a imposição da felicidade constante. Cobram-nos que sejamos pessoas fortes o suficiente para superar, com um sorriso nos lábios, quaisquer obstáculos. Temos de demonstrar força e capacidade de superação que estão longes da condição humana. 
Assim, venho a público para manifestar minha indignação contra a ditadura de 100% de felicidade e, para tanto, requisito que sejam resguardados os seguintes direitos a mim conferidos pela Constituição Federal do Brasil, de 5 de outubro de 1988, em seu artigo 5º, caput, e incisos IV e IX:

  • Sou livre para expressar meus sentimentos, sejam eles alegres ou tristes, porque, não há um ser humano sequer, apenas um que seja, que não viva momentos de dor, solidão, frustração, decepção, desilusão,angústia, medo, incerteza....
  • Tenho liberdade para manifestar meus momentos difíceis sem ser considerada uma pessoa depressiva, beirando ao suicídio, mesmo porque, a liberação das angústias, libera, também, a dor do coração.
  • Tenho direito a chorar, berrar, gritar, espernear, quando, ao tomar minhas injeções semanais, eu estiver me sentindo extremamente só, sem que seja taxada de fraca ou qualquer outra coisa do gênero.
  • Venho requerer minha liberdade de expressão artística para que eu possa materializar em minhas obras, tanto minhas alegrias, quanto minhas deficiências, sem que seja considerada portadora de transtorno bipolar artístico.
  • Preciso, também, que me seja assegurado o direito de ter esperança, mas que, em um dia escuro, possa sentir desesperança sem que me considerem fraca ou desistente de lutar.
  • Solicito o direito de, quando me sentir cansada, poder sentar-me para descansar, sem que achem que estou desistindo da caminhada.
  • Requisito poder exprimir meu descontentamento com minha condição de portadora de uma doença degenerativa incurável sem que seja tida como alguém de baixo astral.
  • É meu, também, o direito de expressar meu desagrado quanto aos efeitos colaterais dos interferons, sem que precise ouvir que deveria era agradecer a existência deles, pois disso eu sei, porém, isso não me impede de preferir que eles fizessem os mesmos efeitos sem judiar tanto de mim.
  • Sou livre para reclamar do fato de que os sintomas da Esclerose Múltipla são difíceis de tolerar, sem ter a necessidade de ouvir que há pessoas que sofrem mais que eu. É óbvio que sei disso, porém, a minha dor quem sente sou eu e a dor alheia, por mais que eu possa ser solidária a ela, não é a minha dor, é a dor dos outros.
  • Quero também me resguardar o direito de dizer que tenho medo da enfermidade que me assola sem que tenha de ouvir que não devo dar tanta importância a ela, uma vez que se tentar ignorar sua presença, estarei negligenciando os cuidados que preciso para que ela não possua a mim, mas sim, eu a ela.
Assim, pelos direitos e motivos acima elencados, aclamo aos portadores de doenças crônicas que, assim como eu, subscrevam esse manifesto.

Bete Tezine 


Um comentário:

  1. Olá, Drika, que bom te ver aqui novamente. Concordo plenamente com você! Tanto que já falei em uma das postagens anteriores que só me permito sentir tristeza por um dia, nada mais. Porém, me reservo ao direito de expressar esses dias em minha arte e nos meus textos, sem que com isso seja tida como depressiva e coisas do gênero. Estou cansada de me deparar com pretensas felicidades de pessoas que estão morrendo por dentro, mas, que não têm coragem de se abrirem e partem para criticarem quem o tem.

    Beijo grande,cuide-se também!

    Bete

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