quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Soltando as amarras







Comodismo é o que lhe faz deixar de lutar por seus sonhos e se contentar apenas com o necessário para continuar sonhando.

(Nill Goterra)









Conta a lenda que havia um sábio que andava pelo mundo seguido por um jovem discípulo. Certa vez, chegando a um pequeno lugarejo, pediram estadia em um casebre muito simples. Foram recebidos pela família que lhes deu abrigo e uma parca refeição. Após a ceia, reuniram-se com o dono da casa para uma troca de conversas. Durante o diálogo, os dois visitantes ficaram sabendo que o meio de subsistência da família era apenas uma vaca, da qual tiravam leite e vendiam na cidade. 
Terminada a conversa, foram todos dormir. No dia seguinte, antes de irem embora, o velho sábio chamou seu discípulo e lhe ordenou que fosse até o pasto e atirasse a vaca em um precipício. O jovem se espantou com a ordem recebida de seu mestre, porém, por mais que argumentasse acerca de ser a vaca a única fonte de renda da família, o sábio se mostrou irredutível.
Profundamente decepcionado, ao jovem restou apenas obedecer a ordem recebida. Rumou então para o pasto e, lá encontrando a vaca, levou-a até um desfiladeiro e a empurrou para o precipício.
Voltou, então, para o casebre e, juntamente com seu mestre, despediu-se da família que lhes deu pousada e rumaram para outras paragens.
Passaram-se os anos, tendo o velho sábio já falecido, o jovem discípulo, agora um homem, não conseguia esquecer-se do que fizera, por ordem do mestre, com a humilde família.
Tendo vivido por muitos anos com esse remorso, resolveu procurá-los, confessar o que havia feito, pedir-lhes perdão e lhes oferecer ajuda e solidariedade.
Tendo tomado a decisão, o jovem homem rumou para o humilde casebre a fim de corrigir o que considerava ter sido o único erro de seu velho mestre.
Chegando lá, foi surpreendido com a transformação completa do local. Não havia mais o casebre, pois, em seu lugar, fora erguida uma suntuosa residência. 
Titubeante, ele resolveu tocar a campainha e perguntar aos moradores da casa se haviam conhecido os antigos donos da propriedade. 
Assim que o portão se abriu apareceu um homem ricamente vestido. Então, ele perguntou-lhe acerca dos antigos moradores e, qual não foi a sua surpresa quando recebeu como resposta que era ele mesmo, pois havia nascido e sempre vivido ali. Diante disso, o homem, estupefato, não resistiu a perguntar como fora possível tamanha mudança na vida da família. Mais surpreso ficou ainda quando recebeu a seguinte resposta:
- Sabe o que é moço? Nós tínhamos uma vaquinha da qual tirávamos leite e vendíamos na cidade. O que conseguíamos ganhar com a venda do leite era a nossa fonte de sustento. Porém, certa vez, demos abrigo a um velho sábio e seu jovem discípulo e, após partirem, dei pela falta da vaca, saí a sua procura e a achei morta em um precipício. Desse modo, como não tínhamos mais a vaquinha para ordenhar e vender seu leite, precisamos aprender outros ofícios. Assim, começamos a prosperar e, como pode ver, nossa vida ficou muito melhor.
Após ter ouvido tal história, o rapaz se despediu, sem dizer a que veio, inundado de orgulho pela sabedoria de seu velho mestre.
Hoje, não sei bem por qual motivo, me lembrei dessa lenda que ouvi muito tempo atrás e passei a traçar um paralelo entre ela e minha vida.
Quantas vezes me deixei ficar em situações que não me edificavam, apenas pelo comodismo de não ter de mudar nada?
Quantas vezes não busquei fazer algo novo pelo simples fato de não ousar  transformações por conta de já ter me acostumado com o rumo que tinha dado, anteriormente, à minha vida?
Quantas foram as vezes que me senti estagnada, mas que por falta de motivação continuei sem evoluir?
Qual foi a quantidade de vezes que me deixei ficar presa à relações pessoais que não me acrescentavam nada de bom, apenas para não ter de buscar um recomeço?
Quantas vezes deixei que minha vida fosse conduzida pelas mãos do destino, pelo simples fato de não ter de tomar decisões?
Após inúmeros questionamentos, acabei por vislumbrar que é impossível precisar o número de vezes que deixei que as coisas simplesmente acontecessem na minha vida sem que eu, ao menos, tentasse qualquer tipo de interferência, por comodismo, nada mais.
Não tive a sabedoria do velho mestre que tirou da família sua única forma de sustento, já sabendo de antemão que, tirando-os de sua zona de conforto, eles seriam obrigados a buscar novos talentos e habilidades para suas vidas.
Porém, quando começamos a criar raízes em situações que nos impeçam de evoluir como seres humanos e como pessoas individuais, a própria vida se encarrega de nos tirar de nossa apatia, lançando desafios que nos levam a descobrir e desenvolver, como a família da lenda, novos talentos e habilidades que nunca nos pareceram possíveis.
De mim, a vida tirou a saúde, como forma de me fazer sair da estagnação em que me permiti ficar por tempo demais, fazendo com que eu me reinvente diariamente a fim de encontrar meu crescimento pessoal.


Um beijo reflexivo...


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