sexta-feira, 30 de agosto de 2013

30 de agosto: Dia nacional da conscientização sobre a Esclerose Múltipla


Passei quase toda madrugada e boa parte do dia de hoje refletindo sobre o  que escrever para não deixar passar em branco o Dia nacional de conscientização sobre a Esclerose Múltipla. 
Pensei que poderia abordar o que não gostamos de ouvir das pessoas acerca da nossa condição de esclerosados, mas isso a Fabiana já fez muito bem, diga-se de passagem, em seu blog no decorrer desta semana (clique aqui para ler o post). Pensei, também, em falar sobre o que gostaríamos de ouvir das pessoas sobre nossa patologia, entretanto, isso também a Bruna já fez em seu blog com tamanha propriedade que não ouso acrescentar um vírgula sequer em suas palavras (clique aqui para ler o post).
Assim, por mais que eu tenha refletido em como abordar a importância do dia de hoje, não encontrei uma maneira melhor do que dizer que nós, esclerosados, somos todos vencedores, pois, viver acompanhado de uma companhia tão indigesta e geniosa não é para qualquer um, mas, para os verdadeiramente fortes, para aqueles que sabem enfrentar, dia-a-dia, todos os desmandos da Esclerose Múltipla com determinação e a certeza de que ela não é maior e nem melhor que nenhum de nós.
Eu sei que têm momentos em que ela nos submete aos seus caprichos de menina má, nos tirando as forças, nos fazendo quase sucumbir, porém, ao menor descuido seu, nos rebelamos e retomamos o comando das nossas próprias vontades.
É, de verdade, todos nós merecemos aplausos por estarmos tirando de letra, uns com menores, outros com maiores dificuldades,  maneiras de seguirmos vivendo apesar de todos os prognósticos que recebemos por sermos portadores de uma doença progressiva e incurável, sobremaneira uma tão imprevisível feito a que compartilhamos.
Sinceramente, eu espero que um dia, não muito distante, quando falar para alguém que tenho Esclerose Múltipla, eu não veja em seus olhos piedade e nem o ouça dizer algumas das falas que tanto nos decepcionam, mas que eu possa vislumbrar, apenas, compreensão e esclarecimento. No entanto, tenho plena convicção que esse dia só chegará com a conscientização plena e a divulgação em grande escala dos sintomas e do que é a Esclerose Múltipla e, isso, todos nós sabemos, não será feito apenas no dia 30 de agosto de cada ano, mas em todos os dias do ano, por cada um de nós, quando procurarmos esclarecer a todos os que pudermos sobre a enfermidade autoimune, desmistificando, derrubando mitos e preconceitos a seu respeito. 
É mais do que tempo de que a Esclerose Múltipla deixe de ser quase um tabu, até mesmo para muitos profissionais da saúde, passando a ser vista com olhares realistas e ausentes de dó e opiniões pré-formadas.
Para finalizar, uma salva de palmas para todos nós que estamos carregando essa mala sem alça, não por vontade própria, mas, por imposição da vida que nos escolheu por saber que suportaríamos o seu peso sem nos deixar abater, nem por ela, nem por sua pesada bagagem.

Um beijo conscientizador no coração de cada um! 



segunda-feira, 26 de agosto de 2013

365 dias divagando sobre mim...







Como posso me calar, se o único bem que me foi dado é o poder da fala ‘falada’ e da fala escrita?

(Lorena Souza)







Hoje, dia 27 de agosto de 2013, este blog está comemorando seu primeiro aniversário. Hoje, completam 365 dias em que publiquei, timidamente, o primeiro post que me enveredou pelo mundo virtual ao qual eu vinha resistindo bravamente.
Nesses 12 meses em que o blog está no ar, escrevi, contando com este, 151 posts nos quais eu falei de minhas mais profundas emoções, de experiências como portadora de Esclerose Múltipla, mas, principalmente, experiências humanas.
Falei de tantos assuntos. Falei de medo, de solidão, de perdas, de saudades, de amor, de amar, de amores que se quebraram no tempo, de desilusões, de conquistas pessoais, de preconceitos, de aceitação, de dores do corpo e da alma, de maternidade, de sonhos, de decepções, de amizade, de descobertas, de redescobertas, de partidas, de chegadas, de silêncio, de gritos de socorro, de reencontros, de perdas, de ganhos, de vitórias pessoais, de derrotas, de força, de fraqueza, de vida... principalmente de vida, de viver, de reviver...
Devo confessar, a bem da verdade, que eu não imaginava, quando comecei, que chegaria a tanto, jamais passou pela minha cabeça que teria um seguidor sequer, muito menos que teria acessos de vários países do mundo. É certo que minha escrita, que meu autorretrato emocional não agrada a todos, mas, quem na história da humanidade chegou a tanto? Sou transparente, sou verdadeira e tenho encontrado nos meus textos uma forma de manter minha sanidade mental. Derramar minhas dores ou minhas conquistas pessoais nos posts que aqui escrevo tem me preservado, durante todos esses meses, de uma quase loucura. É óbvio que tenho dias de surtos emocionais, como todos têm, mas, no geral, tenho conseguido lidar com minhas dores, meus anseios, minhas emoções contraditórias, transformando sentimentos, lágrimas e sorrisos em escrita. Eu sou daquelas pessoas que possuem uma urgente necessidade de falarem do que se passa em seus interiores para se manterem sãs, assim, coloco minhas emoções para fora em forma de palavras, tanto escritas, como faladas. Essa, é minha forma de lidar com o que eu não consigo controlar e, ao menos para mim, tem funcionado muito.
Diante de tudo isso, quero fazer um agradecimento emocionado a todos os que têm dedicado alguns minutos de seus tempos para lerem minhas divagações. Quero agradecer, de coração, pela paciência, pelos comentários, pela fidelidade em me acompanharem durante todos esse ano inteiro. Assim, a vocês, que se tornaram por uma ou outra razão leitores do blog, meu muito obrigada! Obrigada pela paciência, pelo apoio, pela compreensão e, principalmente, pelo respeito às minhas emoções!

Beijos emocionados no coração de cada um de vocês!


quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Um novo ser a cada dia...

Bete Tezine, Autorretrato, 2013.



Eu... eu... nem eu mesmo sei, nesse momento... eu... enfim, sei quem eu era, quando me levantei hoje de manhã, mas acho que já me transformei várias vezes desde então.

(Lewis Carroll)




Hoje me peguei a refletir como, a cada dia, nos descobrimos sendo uma nova pessoa. Não há como sermos os mesmos de ontem e, ontem, não fomos os mesmos de anteontem e, amanhã, não seremos os mesmos de hoje e assim por diante. A cada dia, somos alguém diferente do que fomos até então, mesmo que as mudanças sejam praticamente imperceptíveis a olho nu. Agregamos vivências, valores, sonhos, projetos, uma nova forma de olhar, um novo entendimento, um ideal... bem como abandonamos algumas crenças, algumas opiniões formadas, convicções arraigadas... Sendo assim, nunca seremos exatamente iguais a nós mesmos, mas, um novo ser que se descobre a cada amanhecer.
Desse modo, se já é da natureza humana estar em constante mutação, o que se há de dizer, então, das transformações que sofremos quando descobrimos que nossa vida nunca mais será a mesma em face de uma enfermidade grave, sobremaneira uma incurável, degenerativa e progressiva, tal qual a Esclerose Múltipla.
Posso dizer, com propriedade de causa, que sofremos uma transformação tão brusca que nos faz dormir uma pessoa e acordar outra, não com mudanças sutis, mas, com profundas alterações nas mais diversas esferas das nossas vidas. 
O corpo sente, a mente sente, o coração sente, as emoções sentem e, em face desse novo sentir, ganhamos novas características que vão se somando umas às outras e nos transformando em novas pessoas, algumas vezes mais frágeis, mas, em sua grande maioria, muito mais fortes em determinação e vontade de viver.
Porém, existem outras situações que provocam mudanças radicais em quem somos: são momentos traumáticos, dolorosos, perdas incalculáveis, sonhos despedaçados, desilusões, grandes conquistas, corações partidos... tudo isso faz com que nos remodelemos, nos moldemos para que possamos prosseguir vivendo, um dia por vez, todos os dias do resto das nossas vidas.
Então, se me disserem que não sou mais a mesma pessoa, vou responder, simplesmente, que ninguém é mais a mesma pessoa de antes, muito menos eu.

Um beijo remodelado!

sábado, 17 de agosto de 2013

Estou com saudade de você...









A saudade é uma dor que fere nos dois mundos.

(Chico Xavier)









Não sei se existe sentimento mais pungente que a saudade. Não há sentimento que nos provoque maior sensação de impotência que a falta de alguém que está fora do alcance das nossas mãos, mas, tão dentro de nós, tão entranhado nas nossas lembranças, que não há como deixá-lo fora dos nossos pensamentos por um instante sequer.
A saudade fere, a saudade fragiliza, a saudade arranca suspiros, lágrimas dolorosas, pensamentos dilacerantes...A saudade é uma dor pontiaguda que perfura, intermitentemente, um coração descompassado que só bate por bater...
Não há analgésico que acalme a dor da saudade. Não há torniquete que estanque o sangue que jorra da ferida aberta que não cicatriza nunca.  Para dor de saudade só há um tratamento possível: a presença, o reencontro, o abraço, o olhar nos olhos, o ouvir a voz, o contemplar de um sorriso...
Mas, quando não há mais possibilidade da presença física, a saudade se torna uma doença crônica, daquelas para as quais não há cura. Ela  não nos abandona e nunca vai parar de doer, apenas vamos aprendendo, pouco a pouco, a conviver com ela de forma que ela não nos tiranize tanto. 
Estou com saudade de você...




Um beijo inundado de saudade...

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Não sou deficiente! Sou diferente!








Minha esposa não é deficiente, ela é diferente! Deficiente é o preconceito de vocês.

(Gilmar Tezine)






No dia em que minha neurologista fechou meu diagnóstico de esclerosada, junto com todas as explicações que me deu, ela me recomendou que fizesse o cartão de estacionamento em vagas especiais e a carteirinha da ABEM para ser apresentada caso fosse questionado o por quê de eu estar em fila preferencial, enfatizando que já que eu teria de carregar a Esclerose Múltipla comigo, que ela ao menos me desse algum benefício em tê-la em minha companhia e que ninguém, só de me olhar, saberia o quanto me custa estacionar o carro e andar um quarteirão, ou mais, até onde preciso ir ou ficar em pé por algum tempo em uma fila. 

Acatando tais recomendações, providenciei o cartão de estacionamento e recebi uma carteira de esclerosada oficial do laboratório que fabrica o Rebif. Assim, passei a me utilizar das vagas especiais e das filas preferenciais toda vez que delas necessito. Afora alguns olhares de reprovação, nunca fui questionada acerca do que me levou a estacionar ou estar em lugares reservados às pessoas especiais.
Todavia, há cerca de 1 semana atrás, vivi uma situação por demais constrangedora e que se maximizou por ter acontecido em um dia em que eu estava realmente péssima. Como diz um dito popular, há dias em que engolimos um elefante, porém, há outros que engasgamos com uma formiga. Eu estava em um dia que qualquer formiga ficaria parada na minha garganta, tal o estado emocional e físico em que me encontrava naquela noite. A fadiga me dominando, a tristeza fazendo festa em meu coração, meus pensamentos martelando dores e angústias, sem parar, dentro da minha cabeça. Pois bem, foi nesse estado em que sofri o pior tipo de discriminação pelo qual passei desde que me descobri esclerosada.
Eu fui ao supermercado fazer compras acompanhada pelo meu marido e, à certa altura, as minhas pernas começaram a dar sinais de que não me carregariam mais por muito tempo e resolvemos dar as compras por encerradas. O supermercado estava cheio e, exceto a fila para poucos volumes, todas as outras estavam grandes, inclusive a preferencial. No entanto, escolhi a preferencial por ser a única que tinha lugar para eu me sentar enquanto esperava minha vez de pagar as compras. Então, me sentei e meu marido ficou na fila com as compras, quando uma senhora chegou com um carrinho com bem poucos volumes e olhou para ele de cima a baixo, depois olhou para a placa sobre o caixa, depois olhou para ele de novo, até que resolveu ir para a fila ao lado que só tinha 1 pessoa na frente dela. No entanto, ao invés de ficar feliz porque ia pagar suas compras e ir embora, no momento em que passou pelo caixa, perguntou bem alto à operadora se podia pagar suas compras ali, ao obter resposta positiva, ela disse assim: mesmo porque têm pessoas na fila que não deveriam estar e apontou para o meu marido. Nesse momento, eu me virei para ela e perguntei se ela tinha falado aquilo para mim, ela falou que sim porque aquela fila não era para pessoas como eu. Nesse momento, meu marido respondeu para ela que era sim, porque eu era deficiente físico ao que ela revidou dizendo que só se minha deficiência fosse falta de educação por estar em uma fila que não devia estar. 
Meu estado era tão complexo, que não tive boca para dar a ela a resposta que merecia, mas, meu marido, assumiu o comando do bate-boca e lhe disse que gostaria que ao menos, por um único dia,  ela tivesse Esclerose Múltipla e sentisse no próprio corpo uma fadiga extenuante quanto a que eu estava sentindo naquele momento. A senhora não se contentou e começou com ofensas, chegando a ameaçar a agredir meu marido fisicamente. Houve uma intensa troca de ofensas que culminou com as seguintes palavras do meu marido que me surpreenderam demais: pensando bem, minha mulher não é deficiente, ela só é diferente, deficiente é o preconceito de vocês.
Ao ouvir isso, a senhora se retirou do supermercado sem dizer mais uma palavra sequer e as demais pessoas que acompanhavam a discussão baixaram a cabeça e se calaram também.
Saí do supermercado com os olhos marejados de lágrimas, pensando em como é difícil sentir no próprio corpo sintomas invisíveis aos olhares externos.

Um beijo diferente no coração de cada um!

domingo, 11 de agosto de 2013

Pai, você me faz muita falta...

Uma das poucas fotografias que
 tenho junto com meu pai:
 meu casamento em dezembro/ 90.







Para onde fores, Pai, para onde fores,
Irei também, trilhando as mesmas ruas...
Tu, para amenizar as dores tuas,
Eu, para amenizar as minhas dores!

(Augusto dos Anjos)













Neste ano, no dia 26 de julho, completou 13 anos que perdi meu pai para um aneurisma cerebral. Foi um momento complexo em todos os sentidos. Ele teve morte cerebral, mas seu coração continuou batendo por quase 1 semana sem ajuda de aparelhos, porém, não pudemos doar seus órgãos porque ele era alcoólatra e tudo estava comprometido.
Foi muito difícil ver a vida abandonando seu corpo aos poucos, porém, nada se compara à dor por me sentir impotente diante da morte e, principalmente, por sentir que eu não havia feito nada para impedir que ele chegasse àquela situação. Eu não o ajudei a abandonar a bebida, eu não lhe dei minha mão enquanto eu podia, eu não o compreendi, apenas me revoltei com as suas atitudes, com as suas ofensas morais, sem no entanto me perguntar o porquê dele ter se entregue ao vício da bebida. 
Meu pai sempre bebeu desde que eu tenho lembrança, todavia, quando completei 13 anos, ele passou a substituir o café da manhã por bebidas alcoólicas e o almoço e o jantar... passava o dia inteiro alcoolizado e isso durou todo o restante dos seus dias.
Ele nunca foi agressivo fisicamente, nunca deu um tapa sequer em nenhum de nós, porém nos agredia moralmente e isso doía mais que qualquer bofetada. Eu me revoltei contra ele, eu evitava sua presença, eu chorava, tinha crises nervosas e quantas não foram as vezes que desejei que ele simplesmente fosse embora e nos deixasse em paz. E, de repente, ele se foi e nesse momento meu chão se abriu e e me senti a pior filha do mundo.
Por muitos anos carreguei o peso de não ter feito nada para resgatar meu pai do alcoolismo, pelo menos sempre pensei que nada tivesse feito para que ele abandonasse o vício. Porém, depois da Esclerose Múltipla, quando fui fazer terapia, percebi que fiz, sim, tudo o que eu pude, dentro do que me era possível fazer em face do que fui forçada a viver desde muito criança. Aos 13 anos assumi meu próprio sustento, mais o dos meus 3 irmãos e da minha mãe. Fui trabalhar de dia e estudava à noite em uma escola muito longe de casa. Desde muito cedo aprendi que a vida não perdoaria se eu não desse o melhor de mim. 
Foi muito difícil, confesso, e não posso dizer que ainda não bata uma angústia vez ou  outra, principalmente em dias como o de hoje, mas estou aprendendo que não sou culpada por meu pai ter se tornado alcoólatra e nem por sua morte prematura. 
Hoje, foi a primeira vez que consegui falar abertamente sobre esses sentimentos e estou me sentindo aliviada por isso.
Por fim, quero dizer ao meu pai, onde quer que ele esteja, que apesar de eu nunca ter sabido demonstrar, meu amor por ele sempre existiu. Queria muito que tivesse sido diferente entre nós dois, mas eu sei, também, que a sua maneira, ele sempre nos amou, embora não entendêssemos sua forma de amar enquanto esteve conosco. 
Pai, você me faz muita falta...

Um beijo meu pai! Continue descansando em paz...