terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Solidão a duas...





Minha solidão não tem nada a ver com a presença ou ausência de pessoas… Detesto quem me rouba a solidão, sem em troca me oferecer verdadeiramente companhia…


(Friedrich Nietzsche)





Fazia meses que eu não acordava me sentindo tão sozinha como acordei hoje. E, mais uma vez, não foi qualquer tipo de solidão, mas daquela solidão gritante, cortante, lancinante que machuca a gente, que nos toma por refém, que nos envolve, martiriza, arranca o sorriso dos lábios, sem piedade, e nos devolve, em troca, um nó na garganta que sufoca, suspende a respiração e toma conta de todo nosso ser.
É, eu acordei me sentindo terrivelmente só. 
Não sozinha por ausência de companhia. 
Não sozinha pela falta de alguém.
Mas sozinha com os meus medos, meus anseios, minhas inquietações, meus fantasmas, minhas sombras, minhas desilusões, minhas angústias indefinidas, minhas neuroses...
Um sentir-se só que faz com que a Esclerose Múltipla que fica sempre me espreitando, querendo encontrar uma brecha para tomar conta de mim, se achegue, sorrateiramente, sussurrando coisas nos meus ouvidos, encobrindo a luz que ilumina meus dias, se agigantando de tal forma, diante de mim, que eu quase me deixo levar por ela tal a minha falta de energia quando estou tão só.
Eu e a Esclerose Múltipla... o pior tipo de solidão que existe.
Uma solidão que fala.
Uma solidão que arrepia.
Uma solidão que dói.
Uma solidão que amedronta.
Uma solidão que corrói.
Uma solidão que desestrutura.
Uma solidão que exaure.
Hoje, eu acordei me sentindo sozinha. Não uma solidão qualquer, mas o pior tipo de solidão que existe... a solidão a dois, ou melhor, a duas...

Beijos solitários...

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Ir e vir...

Bete Tezine, Autorretrato, 2014.

Vivo num constante ir e vir,
onde pra mim,
nem curvas,nem esquinas turvas,
nem aos tropeços paro!
Levanto...
Sigo cada vez mais lapidada...
mas preparada pra chegar onde eu quero

(Patty Vicensotti)




Não sei se já falei em algum outro post que fui agraciada pela vida, além da Esclerose Múltipla, com epilepsia. Minha neurologista disse que é raríssimo alguém ser portador das duas anomalias, mas eu tenho, infelizmente.
Minhas convulsões são rápidas, duram poucos segundos, porém, dependendo do que eu esteja fazendo, causam um estrago sem tamanho. Por conta delas eu tenho 10 pinos e uma placa de aço dentro do tornozelo esquerdo, já estirei o ligamento do tornozelo direito, já apaguei no volante e colidi com dois outros carros, afora outros eventos que não deixaram sequelas além de alguns hematomas pelo corpo.
Eu descobri que sou epilética 2 meses antes de ser diagnosticada como portadora de Esclerose Múltipla e faço uso de anticonvulsivo desde então e, há quase 1 ano, após o aumento da dose diária, estou livre das convulsões. Porém, após o incidente isolado no volante, meu marido fica inseguro cada vez que preciso ou quero ir sozinha, dirigindo, a algum lugar. Na verdade, ele sempre tenta me fazer levar alguém comigo. Mas eu resisto, resisto bravamente, pois minha liberdade de ir e vir, sozinha, tem uma importância primordial para mim.
Já escrevi um post falando do fantasma da dependência, do medo que me ronda, por mais que eu tente espantá-lo, de perder minha autonomia. Portanto, enquanto minhas pernas puderem me levar aonde eu quero e preciso ir, eu irei, irei sem medo, irei sozinha, irei segura de mim.
De verdade, eu entendo todas as preocupações comigo. Entendo o receio de que aconteça algo enquanto eu dirijo, mas eu necessito dessa liberdade, necessito poder andar com as minhas próprias pernas, necessito ir e voltar, ir ou ficar, por meu querer, por minha vontade, por minha disposição.
Sendo assim, enquanto minha companheira indigesta permitir que eu tenha autonomia de me locomover sem necessitar de qualquer tipo de apoio, enquanto ela continuar, embora pesada, ainda possível de ser carregada, eu continuarei indo e vindo como e quando eu quiser ou necessitar  e, devo dizer, que isso não tem nenhum resquício de orgulho, muito pelo contrário, significa apenas que eu não fui dominada e, espero jamais ser, pelos caprichos da Esclerose Múltipla. 

Um beijo livre no coração de todos!

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Não se torne um aprisionador de almas...


Depois de algum tempo a gente aprende a diferença, a sutil diferença entre dar a mão e acorrentar uma alma. E aprende que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança. E começa a aprender que beijos não são contratos e que presentes não são promessas. 

(Shakespeare)

Ontem estive refletindo no erro que estaremos cometendo caso façamos de outra pessoa, que não seja nós mesmos, a única razão da nossa vida. 
Não estou dizendo que pessoas não serão tão ou mais importantes para nós que nós próprios, pois nossos filhos, por exemplo, serão sempre colocados em primeiro lugar e não tem como ser diferente. Mas, o que estou querendo dizer, na verdade, é que temos de ter consciência de que não podemos nos agarrar a alguém, de tal forma, que nos tornemos pesados demais para sermos carregados. Nesse ponto, dá pra fazer uma analogia com alguém que está se afogando e, na ânsia de salvar a própria vida, se torna tão pesado para quem tenta lhe salvar que o arrasta para o fundo, não se permitindo ser salvo e ainda quase levando o outro à morte também.
Não podemos ser pesados porque peso sufoca e, se sufocar, corta a respiração e, sem respirar, morre-se... morre-se em vida, a pior forma de morte que alguém pode ter.
Pessoas sempre entrarão nas nossas vidas e nela permanecerão pelo tempo que quiserem ficar. Temos de ter sempre a consciência disso. Temos de entender que chantagens emocionais, dependência de todos os tipos, amor unilateral, não serão capazes de aprisionar uma alma ao nosso lado, pois, por mais que consigamos aprisionar um corpo, será apenas isso, um corpo inanimado cedendo aos nossos apelos, uma vez que o que contam mais, ou seja, a alma, o coração e o querer, estarão em outras sintonias; o brilho nos olhos terá se apagado e a morte será quase certa... estaremos cometendo, inconscientemente, um homicídio espiritual.
Outro erro terrível que cometemos é acreditar que porque alguém está conosco, ele se fundiu a nós, transformando-nos em uma única pessoa. Isso não existe. Por mais que haja amor e vontade de compartilhar a vida, cada um permanecerá um ser individual, caminhando paralelamente, mas cada qual com a sua própria personalidade, seus próprios anseios e sua individualidade. Portanto, quando passamos a não respeitar o espaço do outro, exigindo dele que seja uma extensão de nós mesmos, estaremos, mais uma vez, nos tornando um peso desnecessário pronto para ser descartado assim que houver a primeira oportunidade. 
Refleti, também, sobre o egoísmo do ser humano no que se refere ao amor. É engraçado como superamos mais rapidamente a morte do que um divórcio. Ficar viúvo não pesa tanto quanto uma separação. Sei que pode parecer exagero, mas analisando friamente, saber que o outro partiu sem volta e que não haverá mais ninguém na vida dele é mais fácil de carregar do que ver o outro reconstruindo a própria vida, principalmente se for ao lado de outra pessoa. A dor de ser preterido é mais contundente, embora poucos tenham coragem de admitir isso, do que a dor da perda para a morte. 
Por fim, percebi que relacionamentos não significam abrir mão da própria existência para viver a vida do outro, mas significam ser tão leve de ser carregado que o outro não sinta nosso peso e nos leve por muito tempo, de preferência para sempre, dentro dele. 
Então respire, mas deixe o outro respirar também e não se torne um aprisionador de almas...

Beijos leves e livres!

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Ano novo... e a fadiga continua a mesma...



O meu cansaço não será desfeito com um longo banho ou uma noite de sono... 

(Eve Frozino)



Depois que escrevi o post natalino, tinha comigo a ferrenha intenção de fazer uma retrospectiva de 2013 e escrever sobre minhas resoluções de ano novo, no entanto, como esclerosada que sou e como as temperaturas resolveram ficar nas alturas, mais uma vez, como em muitas outras situações, eu me vi impedida de levar adiante uma decisão, simplesmente por me ver tomada pela fadiga, em tal nível, que pensar, enxergar, falar, me mover, foram coisas quase que impossíveis por vários dias. 
Fiquei imprestável, na verdadeira acepção do termo. As dores nas pernas ficaram quase que insuportáveis, os braços fraquejaram, meu corpo simplesmente não obedecia aos comandos do meu cérebro, o que me fez lembrar das palavras que uma leitora do blog deixou nos comentários de um post e que eu pego de empréstimo para ilustrar o que eu senti nesses dias de festas:

 É lúdico dizer que quem tem E.M. pode e deve levar uma vida normal, quem tem sabe que é como ter um motor de Ferrari em uma carroceria de charrete, tudo pode contribuir para acidentes, até um fiozinho de água, ou uma pedrinha de rio, a cabeça quer mas o corpo não obedece.

Ah! Como eu me vi nessas palavras dela! Pois, ela traduziu exatamente como me sinto... meu cérebro é um motor que, embora às vezes demonstre cansaço, ainda tem uma potência considerável, mas está enclausurado em um chassi frágil, a aerodinâmica não ajuda em nada, podendo se perder nas curvas, exigindo um cuidado redobrado ao ser dirigido. Os pneus estão carecas, derrapam com facilidade, enquanto o câmbio está apresentando problemas para engatar as marchas mais rápidas, então, praticamente, só tenho andado em primeira e segunda marchas, o que atrasa, deveras, minha viagem. O radiador não dá conta de refrigerar o motor, pois a bomba d'água está apresentando vazamentos, o que superaquece meu corpo.
Porém, tudo isso seria muito fácil de ser resolvido, se ao invés de eu estar falando metaforicamente do meu corpo esclerosado, eu estivesse falando de um carro velho que estivesse dirigindo, pois um carro poderia ser reformado, recebendo novos acessórios, reparos mecânicos e na carroceira, ou, caso fosse inviável a reforma, poderia comprar um carro que atendesse minhas necessidades da melhor forma possível. 
Mas, quem compartilha da presença indesejável e extenuante da Esclerose Múltipla em sua vida, comigo, sabe exatamente que não podemos trocar nossas "peças" cujas validades forem vencendo, não há como turbinarmos nossas "carrocerias". 
Sendo assim, o que nos resta, é cuidar da melhor forma do que temos, respeitar nossos limites, dirigir-nos cuidadosamente pelas curvas da vida e viver um dia por vez, vencendo as distâncias um passo de cada vez.

Beijos fadigados!