sexta-feira, 28 de março de 2014

Hoje acordei esclerosada...




Essa fadiga me gangrena a alma, 
Destruindo-me pouco a pouco,
Bem lenta e dolorosamente.


(Fabricio Canalis)



Hoje acordei completamente esclerosada.
Bem, vão me dizer que isso não é novidade, posto que eu sou esclerosada, mas, devo dizer que eu tenho Esclerose Múltipla, mas nem todos os dias eu me sinto esclerosada. Ainda bem!
Porém, tenho dias difíceis, a bem da verdade, dias de dor, tremor, fraqueza, choque, espasticidade, medo, angústia, solidão, autopiedade... dias como o de hoje que levantar da cama foi uma tarefa árdua e me manter de pé um esforço demasiadamente grande para as minhas forças.
Hoje a fadiga transpareceu em meus olhos e meu sorriso sem cor demonstrou o quão pesado estava arrastar comigo a minha companheira de vida.
Hoje minhas palavras saíram arrastadas, meus pensamentos embaralharam-se enquanto minha visão se turvou várias vezes no dia.
Hoje eu desejei que a Esclerose Múltipla nunca tivesse entrado na minha vida, com tanta intensidade, que se ela tivesse qualquer grau de sensibilidade sairia porta afora para nunca mais voltar.
Hoje eu me senti com 150 anos de idade aproximadamente, lenta, dolorida, exausta.
Hoje eu quis me rebelar, gritar, espernear, sapatear, mas a fadiga não deixou. Então calei minha voz, trancafiei a rebeldia, aquietei minhas pernas e me deixei ficar, quase inerte, por horas a fio...
Agora, estou me preparando psicologicamente para a aplicação do Rebif e esperando, sinceramente, que ele não resolva se juntar a malvada da Esclerose Múltipla para me extenuarem ainda mais.
Hoje, é só o que eu consigo escrever...

Beijos fadigados...


domingo, 23 de março de 2014

Eu tenho um corpo...

Bete Tezine, Autorretrato, 2014.



O corpo não é uma máquina como nos diz a ciência. Nem uma culpa como nos fez crer a religião. O corpo é uma festa.


(Eduardo Galeano)





Eu tenho um corpo.
Essa afirmação pode parecer completamente óbvia, pois há de se dizer que todos têm um corpo, no entanto, posso assegurar, com a mais pura convicção, que para mim não é nada óbvio descobrir que tenho um corpo.
Na verdade, para muitas mulheres, na minha faixa etária, descobrir-se dona de um corpo é algo surpreendente, mas, ironicamente, é na fase em que o "músculo do tchau" começa a dar ares de desabar, quando a cintura ganha centímetros indesejados, quando marcas de expressão começam a saltar diante do espelho... são nestes momentos que tomamos consciência do nosso corpo e de todas as funções e sensações contidas nele.
Eu tive uma adolescência difícil, praticamente fui obrigada a pular da infância para a idade adulta, pois não tive tempo de acompanhar as mudanças do meu corpo, sentir-me transformando de menina em mulher. Eu estava ocupada demais garantindo as subsistências minha, da minha mãe e irmãos...
Já adulta, casada, meu corpo foi o veículo para eu me tornar mãe, para amamentar meus filhos e eu não me dei conta de que ele era meu e não eu dele.
Eu o negligenciei tanto que ele, arredio, avolumou-se a fim de chamar minha atenção, e eu, acho que pela primeira vez, me dei conta da sua presença, mas não da forma que deveria, mas com repulsa, com desprezo, pois ele não era o corpo que eu queria ter ou que achava que queria.
Então, eu o ignorei, e continuei sem corpo...
Os anos passaram, eu fugindo do espelho, escondendo-me atrás de roupas enormes, mantendo a atenção sobre mim o mais longe possível, um dia acordei esclerosada e, obrigatoriamente, fui obrigada a perceber que meu corpo não estava respondendo mais aos comandos do meu cérebro... então, naquele dia, eu percebi que tinha um corpo, ou melhor, metade de um, pois a metade esquerda eu via, mas não sentia...
Eu parei e me olhei no espelho, analisei cada detalhe do corpo que vinha carregando sem perceber, ou sendo carregada por ele sem me dar conta, e percebi que ele não era bem o que eu queria que fosse, mas era o que eu tinha e que ele sentia coisas, coisas boas também, não apenas dores... ele sentia prazer com alguns toques, algumas texturas, alguns estímulos... 
Eu tinha um corpo... o meu corpo... e ele estava ali a espera de ser valorizado e amado por mim... e eu o amei, amei como se ama a primeira obra de arte produzida, a primeira melodia composta, as primeiras estrofes do poema escrito... amei como se ama um raio de sol em meio à tempestade... a chuva depois de meses de seca... o sorriso após horas de choro convulsivo... eu o amei e ele se transformou... meu corpo se transformou em meu aliado...
Hoje, chamada de gorda por alguns, de fofinha por outros, de obesa pela medicina... eu não me importo mais com estigmas, nem com os "braços de estivador de porto", como eu sempre os apelidei, nem com as coxas grossas demais para os padrões de beleza midiáticos. O que me importa agora é que meu corpo me transporta para dimensões inimagináveis... basta eu fechar os olhos e me deixar levar...

Beijos corporais no coração de todos!

terça-feira, 11 de março de 2014

Ética? O que é isso?

Vejo pessoas pregando moral, respeito, ética, justiça, mas percebo que nem mesmo sabem os verdadeiros significados desses valores. Devem ver outra pessoa no espelho quando se dizem praticantes dos mesmos. Seja bom ou seja ruim, seja sempre você mesmo! Mais atitude e menos blá blá blá !

(Alan Lopes Luiz)


Estive refletindo sobre um termo tão em moda atualmente, um termo que sai da boca de muitos, mas que eu acredito que bem poucos saibam seu real significado e o aplicam em suas relações pessoais, sociais e humanas... estou falando sobre ética. 
O  Dicionário Aurélio define ÉTICA como sendo "o estudo dos juízos de apreciação que se referem à conduta humana susceptível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente à determinada sociedade, seja de modo absoluto".
Não obstante essa definição, eu, na minha insignificância, tenho minha própria definição do que seja ética... para mim, ser ético significa, valendo-me de um dito popular, não fazer ao outro o que não gostaria que fizessem a você. Para mim, essa é a máxima do que seja ética, nada mais.
Agora, colocar isso em prática é, a meu ver, o maior desafio do ser humano, sobremaneira dentro desta cultura competitiva em que se tem incutido, desde a mais tenra idade, que só os fortes sobrevivem, que se tem de levar vantagem em tudo, que o mundo é dos mais espertos e por ai vai.
Pessoas não hesitam em passar por cima das outras a fim de alcançarem seus objetivos, que, mesmo sendo nobres, às vezes, se contaminam com a falta de amor ao próximo, com a ganância desmesurada, com a falta de compaixão.
O homem está cada dia mais degradado, mais corrompido, mais ganancioso e esquece valores que deviam ser o norte de todas as relações humanas, sejam profissionais, pessoais, religiosas, econômicas, sociais, políticas... 
Cobram-se muito os direitos, mas esquecem-se dos deveres. 
Pregam-se muito condutas, mas não se vivenciam as mesmas.
Líderes religiosos que deveriam ser o exemplo do que propagam aos seus fiéis, são flagrados na contramão de tudo o que falam em cima dos altares, púlpitos ou o que quer que os elevem acima dos demais mortais, ao menos nas suas visões deturpadas do que seja um "homem de Deus", como eles se autodenominam.
Detentores de cargos públicos, que são pagos para dirigirem estados e nações, se corrompem pelo poder e ainda se vangloriam pela memória curta dos que os elegeram, na certeza de que o próximo mandato já está garantido.
Aqueles que são pagos para protegerem os cidadãos, muitas vezes se tornam seus algozes da forma mais fria e covarde possível.
Pais, que deveriam ser os maiores protetores dos filhos, os violentam, estupram, espancam, se escondendo atrás de uma pretensa forma de educar.
Os que deveriam falar se calam, os que deveriam se calar gritam.
Então, onde está a ética que circula pelos meios sociais como um termo bonito de se usar, que soa bem aos ouvidos, que torna quem o profere um ser visto como inteligente e antenado com a evolução humana?
Eu não sei a resposta e sinto muito por não poder, ao menos, apontar levemente para ela. Na verdade nem sei mais se ética não passou a ser apenas mais uma utopia. De verdade, espero que não, espero que ainda haja salvação para a humanidade e que se possa, um dia, mesmo que numa geração muito futura, se vivenciar tudo o que se prega, principalmente, no que tange a se colocar no lugar do outro, antes de ferir, julgar, condenar, usurpar, trapacear, enganar, maltratar, discriminar, violar, extorquir, negligenciar...

Beijos éticos no coração de todos!