quinta-feira, 24 de julho de 2014

Mulher de fases...

Plágio

Sempre fui sonhadora
uma xerox imperfeita 
de uma estrela que brilhou
em um tempo que passou.

Sempre fui aventureira
um plágio deformado 
de um poeta contestador
que decanta revolução e amor.

Sempre fui bandoleira
fui do romântico ao rock pauleira
um misto de Rita Lee e Ângela Maria
cheia de manhas e manias.

Já fui musa de verão
fui tema de canção
fui estrofes de poesia
e até Chico Buarque e agonia.

Hoje sou som, luz e fogo
sou silêncio, medo e desejo
sou frases soltas ao vento
sou poema lido ao relento.

(Bete Tezine, 1985)




A vida é feita de fases. 
Desde nosso nascimento, até quando deixamos o corpo físico, atravessamos diversas fases. Nem todas boas, regadas a sorrisos e conquistas, pois muitas são banhadas em lágrimas e perdas nas mais diversas esferas das nossas vidas. Mas, assim como a lua, a fase chega, permanece por um tempo e é substituída por outra que, por sua vez, é substituída por outra, num constante ciclo.
Eu sou feita de fases.
Desde onde minha memória alcança, tenho atravessado momentos que, se eu parar para pensar, alguns deles tiveram tudo para me atirar ao subsolo existencial. Vivenciei dores que imaginei  não sobreviver às feridas dilacerantes que elas abriram na minha alma, mas, com o passar do tempo, elas se transformaram em cicatrizes que, embora não me deixem esquecer que o sangue jorrou dali um dia, hoje não doem mais.
Fui criança pelo tempo que me permitiram ser. Adolescente, não tenho lembrança de ter sido, o que significa que pulei esta importante fase da minha vida, não pela minha vontade, mas pelas circunstâncias que me lançaram da infância à idade adulta sem piedade alguma. Encontrei pessoas pelo caminho que desencadearam inúmeras fases. Fases em que me senti feliz como jamais havia sido, outras em que experimentei o gosto amargo da manipulação, das mentiras, da falsidade, da perda, da decepção, da desilusão, da revolta...
Tive períodos em que me senti agigantar em coragem, força e determinação. No entanto, passei por fases em que me senti tão pequena, impotente e vulnerável que o medo se fez latente, o choro uma constante e vi minha força se esgueirando pelas frestas da janela do meu eu.
E essas fases se repetem, se alternam, se intercalam com frequência por mais que eu me iluda pensando que tenha  controle sobre minhas emoções, pois, assim como não tenho controle sobre os desmandos da Esclerose Múltipla, também não controlo meus momentos de riso e de choro, de vitórias e de perdas, pois  sou humana e, como tal, dona de emoções complexas e, sou mulher que, mais que qualquer outro ser vivo, é dona de fases.

Um beijo repleto de fases...


P.S. A poesia que usei como epígrafe, escrevi quando tinha 15 anos e hoje percebo que, naquela época, eu já sabia que era feita de fases.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Eu voltei...



Como uma pedra que você joga ao mar: a água se agita durante um tempo e depois tudo vai acalmando e volta a se estabilizar. 

(Arlete Salles)




Por vários dias, iniciei vários posts, abordando vários assuntos, mas, cada um deles, se transformou em rascunho sem que eu conseguisse finalizar o que eu queria dizer com as minhas palavras em forma de escrita.
Tive dias difíceis, nos quais minha companheira de vida ficou absurdamente pesada. Tão pesada que me fez voltar para dentro de mim mesma a espera de dias menos doloridos. Contraí algumas doenças oportunistas que se aproveitaram das falhas do meu sistema imunológico. Infecção de urina que me levou à sala de espera lotada de um hospital, de onde voltei com a receita de antibióticos e uma gripe que me prostrou por duas semanas. Fui buscar o Rebif e, como sempre, a farmácia estadual de alto custo estava abarrotada, uma espera de quase 5 horas, com senha preferencial, e voltei com outra gripe que me pegou no período menstrual. Quanta dor, quantos calafrios, quanta intolerância à tudo, quanto choro, quanta vontade de voltar no tempo e descobrir quando foi que a Esclerose Múltipla resolveu fazer parte da minha vida e, quem sabe, eu tivesse tido a oportunidade de espantá-la para bem longe de mim. 
Segunda-feira, dia 7 de julho, eu de novo na farmácia de alto custo, dia ruim, muito ruim, muita fraqueza, dores nas pernas, dor de cabeça, nariz congestionado, dor de alma, me sentindo sem forças e sem vontade alguma para suportar tanto mal estar de uma única vez. 3 horas sentada em uma cadeira desconfortável, depois de 1 hora em pé esperando para receber a senha de atendimento, as lágrimas, por mais que eu tentasse, escorreram várias vezes por trás da lente dos óculos que até bem pouco tempo eu usava apenas para ler, mas que agora eu uso o tempo todo porque, simplesmente, meus olhos não estão enxergando como estavam há alguns meses. Tanta gente naquela sala de espera, tudo fechado porque fazia muito frio e uma névoa branca tomava conta de tudo lá fora e eu, ali, respirando aquele ar, aspirando o que vinha com ele a cada vez que eu tentava conter as lágrimas de autopiedade.
É, eu estava com pena de mim mesma, ali sentada, me sentindo sozinha rodeada por um sem número de pessoas, porque eu não estava em condição de estar ali, mas eu tinha de estar, eu precisava do Rebif para me autoaplicar mais tarde e amanhecer no dia seguinte um pouco pior. 
A terça-feira veio com uma bomba relógio armada dentro do meu cérebro fazendo contagem regressiva para explodir e, meu sistema imunológico, não perdoou eu ter ficado horas respirando um ar que continha tudo que eu não precisava  e uma herpes labial imensa doía, ardia, incomodava e aumentava minha vontade de gritar que eu não estava mais aguentando me sentir tão mal.
A quarta-feira chegou, feriado, aproveitei para fazer o básico dos básicos e repousar bastante, mas a noite veio e com ela o Rebif. 
Hoje, amanheci com outra dor de cabeça infernal, daquelas que analgésicos não resolvem, nem ao menos amenizam. A pseudogripe mais latente do que nunca. As pernas falhando, as dores neurológicas castigando e, por mais que eu quisesse que fosse diferente, fiquei a tarde inteira na cama, ou melhor, estou nela até agora.
De verdade, eu queria retornar a escrever com um post que dissesse que a vida é linda, que tudo vale a pena, que sorrir melhora tudo, no entanto, nada disso faz sentido para mim hoje, quem sabe amanhã, ou depois, eu escreva que os dias difíceis deram uma trégua e que eu estou domando a fera da Esclerose Múltipla muito bem. Quem sabe... 

Beijos que outra vez estão doloridos...