No retrato que me faço
Bete Tezine, Autorretato, 2013. |
- traço a traço -
às vezes me pinto
nuvem,
às vezes me pinto
árvore...
às vezes me pinto
coisas
de que nem há mais
lembrança...
ou coisas que não
existem
mas que um dia
existirão...
e, desta lida, em que
busco
- pouco a pouco -
minha eterna
semelhança,
no final, que restará?
Um desenho de
criança...
Terminado por um louco!
(Mario Quintana)
Materializar as minhas
emoções em meus trabalhos artísticos e expô-los publicamente, embora seja uma
tarefa árdua, não se compara à resistência que sempre tive em expor minha imagem física. Mais
do que não gostar de ser fotografada, nunca gostei de ver o resultado, nunca fiquei à
vontade em ver alguém observando retratos meus.
Porém, ao ser acometida
por uma enfermidade degenerativa e sem cura, a Esclerose Múltipla, fui dominada por uma real sensação
de efemeridade. Percebi o quão frágil é a vida e vi a necessidade de rever
algumas convicções, de superar algumas deficiências, de ultrapassar barreiras
emocionais, de fortalecer meu espírito.
Ironicamente, eu que
sempre resisti em expor minha imagem em uma fotografia, tentando preservar-me
do que os outros enxergam exteriormente em mim, percebi que daqui a algum tempo
minhas pernas poderiam não mais me levar aonde eu queria ir, que minhas mãos
poderiam não mais materializar minhas angústias e que meus olhos poderiam nunca
mais ver minha imagem refletida em um retrato ou, nem mesmo, em um espelho.
Bete Tezine, Autorretato, 2013 |
Diante desses sentimentos inquietantes, decidi por tentar superar essa minha resistência em posar para fotografias, produzindo um tríptico de autorretratos como trabalho final pra conclusão do curso de artes plásticas.
Não dá para afirmar, com total segurança, que apenas a exposição pública desses autorretratos foram suficientes para me fazerem vencer essa barreira de não me permitir ser fotografada, mas, o que posso garantir foi que com a produção deles eu consegui identificar o que me impedia de ficar a vontade diante da câmera fotográfica e, isso, posso afirmar sem receio algum, foi o primeiro passo rumo à superação completa dessa minha dificuldade.
Hoje, passados mais de seis meses da exposição de final de curso, na qual meus autorretratos ficaram expostos à apreciação pública por mais de 30 dias, devo admitir que ainda não fico completamente à vontade diante do foco fotográfico, eu estaria mentindo se afirmasse isso, pois, ainda me sinto como se estivesse interpretando um papel que não é meu, como se estivesse vestindo um personagem que não foi escrito para mim. No entanto, já dei um grande passo em direção à total superação dessa minha deficiência, uma vez que já possuo mais fotografias minhas nesse período, do que possuí durante o restante de toda minha vida.
Bete Tezine, Autorretato, 2013. |
Ainda resisto em fazer pose para que alguém me fotografe, ainda me sinto como que engessada, mas, consegui encontrar uma maneira de eu mesma me fotografar e, assim, tenho me permitido relaxar no momento do clique. Na verdade, ainda estou presa aos autorretratos, mas, sei que vou conseguir, em um futuro próximo, me soltar, também, diante das lentes das câmeras de alguém e, ai sim, poderei dizer que a superação foi completa.
Por tudo isso, mais do que
superar a repulsa em posar para fotografias, desenvolver um autorretrato é
superar deficiências emocionais arraigadas há tempo suficiente para que eu não
me lembre do momento em que se apossaram de mim. Produzir um autorretrato é
fortalecer minha mente. Expor ao público minha imagem é fortalecer meu
espírito.
Um beijo em processo de superação...
Nenhum comentário:
Postar um comentário