sábado, 17 de agosto de 2013

Estou com saudade de você...









A saudade é uma dor que fere nos dois mundos.

(Chico Xavier)









Não sei se existe sentimento mais pungente que a saudade. Não há sentimento que nos provoque maior sensação de impotência que a falta de alguém que está fora do alcance das nossas mãos, mas, tão dentro de nós, tão entranhado nas nossas lembranças, que não há como deixá-lo fora dos nossos pensamentos por um instante sequer.
A saudade fere, a saudade fragiliza, a saudade arranca suspiros, lágrimas dolorosas, pensamentos dilacerantes...A saudade é uma dor pontiaguda que perfura, intermitentemente, um coração descompassado que só bate por bater...
Não há analgésico que acalme a dor da saudade. Não há torniquete que estanque o sangue que jorra da ferida aberta que não cicatriza nunca.  Para dor de saudade só há um tratamento possível: a presença, o reencontro, o abraço, o olhar nos olhos, o ouvir a voz, o contemplar de um sorriso...
Mas, quando não há mais possibilidade da presença física, a saudade se torna uma doença crônica, daquelas para as quais não há cura. Ela  não nos abandona e nunca vai parar de doer, apenas vamos aprendendo, pouco a pouco, a conviver com ela de forma que ela não nos tiranize tanto. 
Estou com saudade de você...




Um beijo inundado de saudade...

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Não sou deficiente! Sou diferente!








Minha esposa não é deficiente, ela é diferente! Deficiente é o preconceito de vocês.

(Gilmar Tezine)






No dia em que minha neurologista fechou meu diagnóstico de esclerosada, junto com todas as explicações que me deu, ela me recomendou que fizesse o cartão de estacionamento em vagas especiais e a carteirinha da ABEM para ser apresentada caso fosse questionado o por quê de eu estar em fila preferencial, enfatizando que já que eu teria de carregar a Esclerose Múltipla comigo, que ela ao menos me desse algum benefício em tê-la em minha companhia e que ninguém, só de me olhar, saberia o quanto me custa estacionar o carro e andar um quarteirão, ou mais, até onde preciso ir ou ficar em pé por algum tempo em uma fila. 

Acatando tais recomendações, providenciei o cartão de estacionamento e recebi uma carteira de esclerosada oficial do laboratório que fabrica o Rebif. Assim, passei a me utilizar das vagas especiais e das filas preferenciais toda vez que delas necessito. Afora alguns olhares de reprovação, nunca fui questionada acerca do que me levou a estacionar ou estar em lugares reservados às pessoas especiais.
Todavia, há cerca de 1 semana atrás, vivi uma situação por demais constrangedora e que se maximizou por ter acontecido em um dia em que eu estava realmente péssima. Como diz um dito popular, há dias em que engolimos um elefante, porém, há outros que engasgamos com uma formiga. Eu estava em um dia que qualquer formiga ficaria parada na minha garganta, tal o estado emocional e físico em que me encontrava naquela noite. A fadiga me dominando, a tristeza fazendo festa em meu coração, meus pensamentos martelando dores e angústias, sem parar, dentro da minha cabeça. Pois bem, foi nesse estado em que sofri o pior tipo de discriminação pelo qual passei desde que me descobri esclerosada.
Eu fui ao supermercado fazer compras acompanhada pelo meu marido e, à certa altura, as minhas pernas começaram a dar sinais de que não me carregariam mais por muito tempo e resolvemos dar as compras por encerradas. O supermercado estava cheio e, exceto a fila para poucos volumes, todas as outras estavam grandes, inclusive a preferencial. No entanto, escolhi a preferencial por ser a única que tinha lugar para eu me sentar enquanto esperava minha vez de pagar as compras. Então, me sentei e meu marido ficou na fila com as compras, quando uma senhora chegou com um carrinho com bem poucos volumes e olhou para ele de cima a baixo, depois olhou para a placa sobre o caixa, depois olhou para ele de novo, até que resolveu ir para a fila ao lado que só tinha 1 pessoa na frente dela. No entanto, ao invés de ficar feliz porque ia pagar suas compras e ir embora, no momento em que passou pelo caixa, perguntou bem alto à operadora se podia pagar suas compras ali, ao obter resposta positiva, ela disse assim: mesmo porque têm pessoas na fila que não deveriam estar e apontou para o meu marido. Nesse momento, eu me virei para ela e perguntei se ela tinha falado aquilo para mim, ela falou que sim porque aquela fila não era para pessoas como eu. Nesse momento, meu marido respondeu para ela que era sim, porque eu era deficiente físico ao que ela revidou dizendo que só se minha deficiência fosse falta de educação por estar em uma fila que não devia estar. 
Meu estado era tão complexo, que não tive boca para dar a ela a resposta que merecia, mas, meu marido, assumiu o comando do bate-boca e lhe disse que gostaria que ao menos, por um único dia,  ela tivesse Esclerose Múltipla e sentisse no próprio corpo uma fadiga extenuante quanto a que eu estava sentindo naquele momento. A senhora não se contentou e começou com ofensas, chegando a ameaçar a agredir meu marido fisicamente. Houve uma intensa troca de ofensas que culminou com as seguintes palavras do meu marido que me surpreenderam demais: pensando bem, minha mulher não é deficiente, ela só é diferente, deficiente é o preconceito de vocês.
Ao ouvir isso, a senhora se retirou do supermercado sem dizer mais uma palavra sequer e as demais pessoas que acompanhavam a discussão baixaram a cabeça e se calaram também.
Saí do supermercado com os olhos marejados de lágrimas, pensando em como é difícil sentir no próprio corpo sintomas invisíveis aos olhares externos.

Um beijo diferente no coração de cada um!

domingo, 11 de agosto de 2013

Pai, você me faz muita falta...

Uma das poucas fotografias que
 tenho junto com meu pai:
 meu casamento em dezembro/ 90.







Para onde fores, Pai, para onde fores,
Irei também, trilhando as mesmas ruas...
Tu, para amenizar as dores tuas,
Eu, para amenizar as minhas dores!

(Augusto dos Anjos)













Neste ano, no dia 26 de julho, completou 13 anos que perdi meu pai para um aneurisma cerebral. Foi um momento complexo em todos os sentidos. Ele teve morte cerebral, mas seu coração continuou batendo por quase 1 semana sem ajuda de aparelhos, porém, não pudemos doar seus órgãos porque ele era alcoólatra e tudo estava comprometido.
Foi muito difícil ver a vida abandonando seu corpo aos poucos, porém, nada se compara à dor por me sentir impotente diante da morte e, principalmente, por sentir que eu não havia feito nada para impedir que ele chegasse àquela situação. Eu não o ajudei a abandonar a bebida, eu não lhe dei minha mão enquanto eu podia, eu não o compreendi, apenas me revoltei com as suas atitudes, com as suas ofensas morais, sem no entanto me perguntar o porquê dele ter se entregue ao vício da bebida. 
Meu pai sempre bebeu desde que eu tenho lembrança, todavia, quando completei 13 anos, ele passou a substituir o café da manhã por bebidas alcoólicas e o almoço e o jantar... passava o dia inteiro alcoolizado e isso durou todo o restante dos seus dias.
Ele nunca foi agressivo fisicamente, nunca deu um tapa sequer em nenhum de nós, porém nos agredia moralmente e isso doía mais que qualquer bofetada. Eu me revoltei contra ele, eu evitava sua presença, eu chorava, tinha crises nervosas e quantas não foram as vezes que desejei que ele simplesmente fosse embora e nos deixasse em paz. E, de repente, ele se foi e nesse momento meu chão se abriu e e me senti a pior filha do mundo.
Por muitos anos carreguei o peso de não ter feito nada para resgatar meu pai do alcoolismo, pelo menos sempre pensei que nada tivesse feito para que ele abandonasse o vício. Porém, depois da Esclerose Múltipla, quando fui fazer terapia, percebi que fiz, sim, tudo o que eu pude, dentro do que me era possível fazer em face do que fui forçada a viver desde muito criança. Aos 13 anos assumi meu próprio sustento, mais o dos meus 3 irmãos e da minha mãe. Fui trabalhar de dia e estudava à noite em uma escola muito longe de casa. Desde muito cedo aprendi que a vida não perdoaria se eu não desse o melhor de mim. 
Foi muito difícil, confesso, e não posso dizer que ainda não bata uma angústia vez ou  outra, principalmente em dias como o de hoje, mas estou aprendendo que não sou culpada por meu pai ter se tornado alcoólatra e nem por sua morte prematura. 
Hoje, foi a primeira vez que consegui falar abertamente sobre esses sentimentos e estou me sentindo aliviada por isso.
Por fim, quero dizer ao meu pai, onde quer que ele esteja, que apesar de eu nunca ter sabido demonstrar, meu amor por ele sempre existiu. Queria muito que tivesse sido diferente entre nós dois, mas eu sei, também, que a sua maneira, ele sempre nos amou, embora não entendêssemos sua forma de amar enquanto esteve conosco. 
Pai, você me faz muita falta...

Um beijo meu pai! Continue descansando em paz...