segunda-feira, 3 de setembro de 2012

A Esclerose Múltipla é invisível?


Assistam ao vídeo abaixo, leva apenas 30 segundos:


Quando justifiquei minha obra Silêncio (clique aqui para visualizar), logo após ter recebido o diagnóstico de Esclerose Múltipla, eu acreditava que ela era uma doença invisível e que só se tornaria visível quando deixasse sequelas graves em meu corpo, sequelas estas que poderiam ser vistas sem nenhum esforço pelas demais pessoas.
Porém, após assistir o vídeo acima, bastaram 30 segundos para que eu mudasse minha opinião quanto à visibilidade da enfermidade. Ela não é invisível. Eu não sou invisível. Nenhum de seus portadores são invisíveis. Muito pelo contrário, somos cerca de 2,5 milhões em todo o mundo e mais de 30 mil no Brasil. Como então podemos ser invisíveis? Como a Esclerose Múltipla pode ser invisível se ela é hoje uma das doenças mais pesquisadas no mundo? 
O que falta é a desmistificação da doença, a superação de preconceitos, maior número de campanhas de divulgação e, acima de tudo, nunca deixarmos de acreditar que, excetuando algumas peculiaridades, somos pessoas tão iguais a quaisquer outras. 
Temos vida além da Esclerose Múltipla porque somos nós que a temos e não ela que tem a nós.
A Esclerose Múltipla tem mil faces.  Tem a face da Maria, do Luiz, da Bruna, do João, da Wilma, do Peter, do Marcelo, do John, do Estevão, da Luiza, da Bete, da Marcela, da Heloísa, do Antonio, do Rodrigo, da Amy, da Andressa, da Paula, do Willian, da Meg, da Tuka, do Tiago, do Pedro, da Bianca, da Fabiana, da Sílvia, do Henrique, do Wagner, da Mae, da Fernanda, do Carlos, do André, da Sueli, da Vanessa, da Ingrid, da Tamara, da Rachel, da Priscila, da Solange, da Fabíola, do Augusto, do Leandro, da Teresa, da Tatiana, do Daniel, do Danilo, do Flávio, da Cristiane, da Rosana, do Ângelo, do Manuel, da Thaís, da Marlene, da Carmem, da Sophie, do Cleyton...
A bem da verdade, nem os sintomas da Esclerose Múltipla são tão invisíveis assim. Perca mais 50 segundos e assista outro vídeo que nos mostra como, ao olhar bem mais fundo, os sintomas pulam aos nossos olhos. É preciso apenas aguçar o olhar e a sensibilidade:




Um beijo completamente visível!!!


P.S.: os nomes que listei no post não são necessariamente de pacientes, mas, meramente ilustrativos.

domingo, 2 de setembro de 2012

Silêncio

Bete Tezine, Silêncio, 2012.
Acumulação, 26 x 36 cm.





Pior é que eu berrei. Berrei com o pior tipo de desespero do mundo. Meu silêncio, meu conformismo, minha aceitação,
minha quase maturidade. Eu tenho a impressão que a hora que eu chorar, vai ser das coisas mais tristes do mundo.

(Tati Bernardi)








             A proposta de produção de uma obra em que estivesse presente o conceito de acumulação chegou, para mim, justamente no momento em que descobri estar acometida pela Esclerose Múltipla e a necessidade do uso do interferon em forma de injeção. Assim, diante da expectativa de ficar dependente de um medicamente que, sabidamente, possui uma gama considerável de efeitos colaterais, não foi muito difícil a decisão acerca de que tipo de objeto acumular. Justificando o trabalho, escrevi o texto abaixo:

            O dicionário Aurélio da língua portuguesa define a verbete acumulação como sendo “1. Ato ou efeito de acumular. 2. Aumento, acréscimo. 3. Ajuntamento de pessoas ou coisas”. Por sua vez, acumular, segundo o mesmo dicionário,  significa “1. Pôr em cúmulo ou montão; amontoar. 2. Ajuntar, reunir (...)”
            Diante dessas definições, notamos que todos nós, no decorrer da vida, nos tornamos acumuladores.
            Somos acumuladores de ideias, de sonhos, de alegrias, de tristezas, de lembranças, de saudades... Acumulamos frustrações, realizações, tentativas de mudanças em diversos segmentos da vida. Alguns acumulam vitórias, outros derrotas. Há aqueles que acumulam paixões, vícios, ilusões, desilusões, dores do corpo e da alma... Existem os acumuladores de riquezas e, também, os de misérias. Alguns acumulam amigos, enquanto outros acumulam inimigos. Acumulam-se objetos inúteis e outros objetos não tão inúteis. Há acumulações de sapatos, roupas, maquiagens, perfumes, bolsas, relógios, carros... Mas, sobretudo, existem os acumuladores de esperanças.
            Acumular esperanças é o que tenho feito há tanto tempo em minha vida que nem me lembro mais. Acumulo esperanças de que meus sonhos se realizem, de que as tempestades se acalmem, de que as dores, tanto do corpo quanto da alma, se tornem, ao menos, suportáveis. É, eu tenho vivido, mesmo, da acumulação de esperanças. Tenho esperado pacientemente por um dia que não sei mais se chegará... Mas, mesmo assim,  continuo acumulando esperanças.
            Desse modo, diante da proposta de produção de uma obra em que estivesse presente o conceito de acumulação, justamente no período em que estou tendo uma necessidade quase insana de acumular ainda mais esperanças, resolvi materializar o sofrimento que tenho vivido pela descoberta de uma enfermidade sem cura.
            Em fevereiro de 2012, após uma maratona de exames, recebi o diagnóstico de que sou portadora de esclerose múltipla. Não gosto do termo portadora, pois dá a falsa impressão de que podemos nos livrar da doença quando bem entendermos, porém não é assim, pois, uma vez que ela nos tenha atingido, ela não nos abandona mais; contudo, é assim que a medicina define quem desenvolve a enfermidade.
            Depois disso, entrei em um período em que passei a acumular, simultaneamente, alívio e medo. Alívio por descobrir o que tenho, por saber que eu não sou apenas uma pessoa hipocondríaca, por saber que tudo o que eu sinto, há anos, e que os médicos não achavam respostas, não eram simplesmente doenças psicossomáticas, doenças criadas pela minha mente. Medo, por me descobrir acometida por uma doença degenerativa sem cura até os dias atuais. Medo do futuro, medo do que me aguarda, medo de me tornar incapaz, medo, medo, medo...
            Muitos me dirão, como já me disseram, que a esclerose múltipla, hoje, não é mais tão assustadora quanto foi há alguns anos atrás. Meu consciente sabe disso, quem não sabe são as minhas emoções. Eu sei que ela não incapacita mais tão rapidamente quanto no passado, porém, é uma doença imprevisível, que ninguém sabe como irá evoluir, nem quando meu próprio sistema imunológico irá atacar, novamente, meu sistema nervoso central e quais sequelas esses ataques deixarão.
            É uma enfermidade que me acompanhará pelo resto dos meus dias e que teima, a todo instante, em me lembrar que ela está ali, mesmo sendo invisível ao olhar dos outros. Sim, invisível, pois quando ainda não deixou sequelas vísiveis (uso de apoio, cadeira de rodas, cegueira, atrofias...), ninguém detecta a sua presença sem que falemos dela, exceto o seu portador, que sente os seus efeitos 24 horas por dia. São tremores, choques, fraquezas, dormências, fadiga, dores neurológicas, intolerância ao calor, instabilidade emocional...
            Atualmente, a maioria dos medicamentos disponíveis para retardar a progressão da doença são em forma de injeções. Assim, iniciarei no dia 02 de abril de 2012, às 23 h, o uso das injeções, que eu me autoaplicarei, dia sim, dia não, por tempo indeterminado, a menos que a medicina encontre a cura para a doença. Essa é mais uma esperança que acumulo. 
            Diante de tudo isso, decidi por acumular seringas e agulhas para injeções como forma de tornar física toda a angústia que me atormenta, pois a opção pelo uso das injeções envolve uma dualidade de sentimentos: sem o medicamento a esclerose progride mais rapidamente, levando à incapacidade em um tempo menor; com o uso dele, a esclerose desacelera sua progressão, no entanto,  o medicamento possui efeitos colaterais bastante severos. Difícil decisão. Mas, optei por conviver com os sintomas se puder preservar, pela maior quantidade de tempo possível, a minha independência física, se eu puder, ao menos, ir e vir quando eu bem entender sem a necessidade da ajuda de outras pessoas, se eu puder abrir os olhos ao acordar e enxergar tudo ao meu redor, se as minhas mãos puderem continuar a exprimir, por meio da arte, os meus anseios, minhas alegrias, minhas dores, minhas inquietações.



Um beijo silencioso!

 

sábado, 1 de setembro de 2012

A fadiga minha de cada dia




O  que há  em mim é sobretudo cansaço - 
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço,
[...]
Um supremíssimo cansaço,
Íssimno, íssimo, íssimo,
Cansaço...

(Cansaço, Álvaro de Campos)








Antes mesmo de saber o que era fadiga e que ela era uma das principais queixas dos portadores de Esclerose Múltipla, ela já estava ligada a mim.  
A definição para o vocábulo fadiga encontrada nos dicionários é: 1. Sensação penosa causada pelo esforço ou trabalho intenso; cansaço; 2. Estafa, esgotamento. No entanto, a fadiga que acomete o portador de Esclerose Múltipla não é apenas essa definida pelo dicionário, nossa fadiga é muito mais avassaladora e incapacitante. Assim, quando pesquisamos o termo dentro do contexto de Esclerose Múltipla encontramos que:
  
A fadiga é o sintoma mais comum da esclerose múltipla, também chamada “lassitude”, e descrita como um cansaço intenso que não tem relação com o nível de atividade nem com o grau de incapacidade física. Pode ocorrer diariamente e mesmo após uma noite de descanso. Tende a piorar com o progredir do dia e a agravar com o calor e a umidade. Aparece facilmente e de repente. É geralmente mais severa que a fadiga normal e é mais provável que interfira nas responsabilidades diárias (emhttp://esclerosemultipla.wordpress.com/2006/05/19/fadiga-causas/).

É essa a fadiga que tem se apossado de mim há anos e que eu não sabia direito o que era. É ela que me faz ficar ofegante, muitas vezes, até mesmo de falar, de mastigar, de ler, de pensar e, constantemente, de fazer outras atividades comuns do dia-a-dia e que eu já não consigo executar sem me sentir extenuada, como tomar banho, lavar os cabelos, andar, cozinhar... Sem restar dúvida alguma , a fadiga,  dentre outros diversos sintomas , é o que mais me incapacita.
Ela descansa enquanto descanso, porém, a qualquer movimento meu, ela se achega a mim como um gato preguiçoso que se esfrega em minhas pernas ronronando. Ela não me dá trégua. Quer estar comigo aonde quer que eu vá e não adianta eu tentar me esgueirar para não ser vista, pois ela pressente que estou tentando ludibriá-la e aí ela não desgruda mais de mim.
Talvez, seja esse o motivo que me leva à profunda identificação com o vídeo para divulgação do dia mundial de conscientização sobre a Esclerose Múltipla que coloquei aqui para vocês assistirem e, como eu, se emocionarem:




Um beijo fadigado!