terça-feira, 2 de julho de 2013

Olhando-se no espelho...






Sábio é o ser humano que tem coragem de ir diante do espelho da sua alma para reconhecer seus erros e fracassos e utilizá-los para plantar as mais belas sementes no terreno de sua inteligência.


(Augusto Cury)





Logo quando iniciei o blog e passei a compartilhar minhas escleroses, não apenas a Múltipla, mas todas as que carrego comigo como pessoa, comecei, também, a publicar meus textos em grupos de portadores de Esclerose Múltipla nas redes sociais. 
Como já escrevi algumas vezes, minha escrita é um autorretrato meu, posto que ela reflete, exatamente,  meu estado de espírito no momento em que derramo minhas palavras sobre as teclas do meu notebook. Eu não consigo e, na verdade, nem tento escrever sobre luz quando meu dia está escuro. Se o sol não adentrou pela minha janela naquele dia, a luz também não se refletirá no que eu escrever, uma vez que não sei falar de amor, se meu coração está repleto de dor, como também não sei falar de dor, se meu coração está inundado de amor...
Eu sou assim e isso é o que faz de mim quem sou.
Então, voltando ao princípio das minhas publicações nos grupos de portadores, encontrei eco das minhas inquietações em um sem número de companheiros de luta. Porém, devo dizer que encontrei muito antagonismo também, sendo taxada, por diversas vezes, de depressiva, de inconveniente, por não esconder minhas frustrações, medos, incertezas, angústias, decepções, desilusões... 
Tanto é que, certa vez, travei um embate virtual com um membro de um dos grupos quando ele questionou a minha forma de lidar com as minhas emoções, transferindo para minha escrita e meus trabalhos artísticos a angústia de descobrir-me acometida pela Esclerose Múltipla. Durante a discussão que tivemos, percebi nele uma certa inquietação, pelo fato, talvez, de eu ter tido a coragem de expor publicamente os fantasmas que me rondam, falando abertamente da minha insegurança, enquanto ele passava o dia inteiro publicando mensagens que falavam que a vida era maravilhosa, que tudo valia a pena, que o céu estava azul, que o mundo era lindo e outras coisas do gênero. Não que eu não veja mérito nisso, muito pelo contrário, é sempre fortalecedor ler mensagens que nos estimulam a não desistir da batalha diária. No entanto, ninguém está bem 100% do tempo, muito menos nós que carregamos conosco uma enfermidade imprevisível e caprichosa quanto a nossa companheira de vida.
Esse  senhor atingiu seu ápice quando me disse que eu não tinha como falar, com tanta propriedade, sobre ser esclerosada, pelo fato de eu ter menos de 1 ano de diagnóstico na ocasião. Nessa fala dele eu percebi, nitidamente, que eu havia me transformado em um espelho para ele, uma vez que o incômodo que eu lhe causava se devia ao fato de que eu, com muito menos tempo de diagnóstico, pois ele já havia sido diagnosticado há mais de 10 anos, segundo informação dele próprio, tinha a coragem de escancarar as janelas da minha alma para deixar antever toda a gama de emoções que a descoberta da nomenclatura do mal que me afligia, por mais de 15 anos, provocou em mim, ao passo que ele se escondia atrás de uma máscara de constante bem estar e felicidade com medo de assumir, para ele mesmo, o temor que sentia na própria pele. Não sei dizer o que aconteceu com ele, só sei que ele não faz mais parte de nenhum dos grupos dos quais participo, talvez por não se sentir a vontade de me ter por perto, mesmo que virtualmente. 
Eu tenho plena consciência de que eu, realmente, não sei nada, ou quase nada, sobre muitas coisas da vida, no entanto, apesar de não saber seu nome e nem antever sua face, por vários e vários anos tenho carregado, dependurada em mim, esta "mala sem alça" da Esclerose Múltipla, tempo suficiente para que eu possa falar do que se passa no meu interior por tê-la como companheira inseparável. 
Não sou a dona da razão e nunca pretendi ser. Não detenho a verdade e jamais deterei, pois a verdade não pertence a ninguém, uma vez que ela depende do ponto de vista e das vivências de cada um. Assim, meu diagnóstico é recente, no entanto, minha caminhada ao longo da estrada de males que me rodeavam feito um fantasma, me dão a certeza de que eu tenho alguma propriedade para falar do que é viver dia-a-dia como portadora de Esclerose Múltipla e, principalmente, como um exemplar da raça humana.

Um beijo espelhado...

2 comentários:

  1. Adorei o texto (como adoro todos). Mas realmente isso só comprova a minha tese de que tem gente que fala porque tem boca e não porque tem cérebro, porque, caso tivesse cérebro, se calaria e não falaria bobagens.
    Bjs

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  2. Olá Bruna!

    Eu também amo todos os seus textos, aliás, foi você quem me inspirou a escrever, lembra?
    Realmente, você tem razão, existem falas e falas e, algumas delas, infelizmente, não tem nenhum conteúdo, além de uma tremenda falta de bom senso.

    Beijos,

    Bete

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