quarta-feira, 31 de julho de 2013

Hoje, está difícil... amanhã é um novo dia!

Bete Tezine, Autorretrato, 2013. 



Nos dias de hoje, cada vez mais, acentua-se a necessidade de ser forte. Mas não há uma fórmula mágica que nos faça chegar à força sem que antes tenhamos provado a fraqueza.


(Pe. Fábio de Melo)



Sabem aqueles dias em que acordamos e não sentimos vontade alguma de sair da cama? Aqueles dias em que acordamos com a sensação de estarmos pesando 1 tonelada? Aqueles dias em que nossa cabeça dói tanto que temos a sensação de que uma bomba relógio foi armada e está prestes a explodir dentro do nosso cérebro? 
Pois bem, foi assim que eu acordei hoje e, em dias assim, eu deixo fluir de dentro de mim toda a revolta que sinto pela minha companheira indigesta, a Esclerose Múltipla para quem ainda não sabe, e toda a gama de sintomas e efeitos que ela me provoca, inclusive o malvado do Rebif que, se aproveitando da minha vulnerabilidade momentânea, resolve me tiranizar também, provocando as dores de cabeça, as pseudogripes, as dores no corpo e tudo o mais que só ele sabe lançar mão para me deixar, literalmente, prostrada.
Já fazia algum tempo em que o Rebif não me maltratava tanto quanto tem feito nessas últimas aplicações, mas, nos últimos dias, ele tem me tomado por refém dos seus caprichos e me deixado doente mesmo e, quando isso acontece, eu sinto maximizar o medo e a angústia que essa doença imprevisível provoca em mim.
Hoje, acordei com uma vontade danada, não de bater na porta do vizinho e desejar bom-dia, como diz a letra de uma música, quisera eu que fosse essa a minha vontade, mas, de banir a Esclerose Múltipla da minha vida aos gritos. Acordei com uma vontade de que tudo não passasse de um sonho ruim, daqueles que agradecemos por termos acordado antes que ele nos assustasse ainda mais. Mas, não foi um sonho, nem mesmo um pesadelo, essa é a minha realidade, infelizmente. 
Sei que muitos vão me achar pessimista, dizerem mesmo que a revolta não ajuda em nada, muito pelo contrário e eu, antecipando-me, já respondo que tenho plena consciência disso, de verdade. No entanto, como ser humano que sou, não tenho como ser forte o tempo inteiro e nem me permito camuflar sentimentos e emoções, a fim de passar uma imagem que não é real, mesmo que momentaneamente. Eu sou completamente transparente e a minha escrita é um autorretrato do meu estado emocional.
Amanhã, quem sabe, estarei melhor. Talvez, e eu torço demais por isso, o Rebif que eu vou me autoaplicar hoje não faça tamanho estrago no meu organismo. Talvez, a dor de cabeça resolva dar uma trégua e meu nariz pare de arder e coçar tanto. Quem sabe meu corpo não amanheça doendo tanto, nem minhas pernas pesando 1 tonelada cada uma. Vou crer que isso irá acontecer. Viram como não sou completamente pessimista?
Assim, vou ficar de molho hoje, dar ao meu corpo o tempo que ele precisa para reagir e não se deixar levar por muito tempo por esses tiranizadores. Amanhã, é um novo dia e, com ele, tudo pode mudar para melhor.

Beijos otimistas!

sábado, 27 de julho de 2013

Que saudades do verão!

Este é o inverno
Bete Tezine, Autorretrato, 2013.

Um frio de leve
vem pra ficar.
A brisa suave
faz a árvore balançar.
O vento sopra
assobiando.
O céu escuro 
vai ficando.
As nuvens passam
de mansinho.
A chuva chega 
devagarinho.
As pessoas correm
abrindo guarda-chuvas.
Vi um homem de casaco
e uma mulher de luvas.
É esse o inverno
sorrateiro.
Vem chegando
e nem avisa primeiro.

(Clarice Pacheco)


Por várias vezes eu escrevi sobre os malefícios que o calor provoca no meu corpo. A fadiga faz festa, a exaustão me consome, a lentidão dita as regras do meu dia. Porém, apesar de ser fã, eu diria que a  fã nº 1, dos dias frios, as baixas temperaturas que os termômetros têm registrado na minha cidade tem me deixado, literalmente, travada.
Eu amo o inverno. Sempre disse que é a estação que nos deixa mais elegantes, uma vez que podemos usar roupas mais estilosas e estruturadas, acessórios tipo boinas e cachecóis, além dos casacos e as botas que eu amo. 
Certa vez, ao dizer isso a um amigo, ele riu muito e falou que não conhecia inverno no Brasil para tanto e eu, em resposta, lhe disse que era porque ele não conhecia o inverno de São Paulo então. Está certo que nem todos os anos faz frio o suficiente para que eu me vista dessa maneira, mas, sempre faz um ou outro dia em que as temperaturas ficam próximas dos 10ºC e eu aproveito para tirar os casacos do armário. 
Todavia, essa semana que está terminando, trouxe com ela os dias mais frios que eu tenho lembrança desde a minha adolescência. Os termômetros despencaram e atingiram a marca dos 6ºC, com sensação térmica próxima dos dos 2ºC ou 3ºC. Esfriou uma barbaridade, diria que ficou congelante mesmo.
Vocês já podem imaginar o meu figurino nesses dias, não é mesmo? Realmente vesti todo o meu arsenal de inverno que há tempos estava guardado. Me realizei quanto às vestimentas, no entanto, a Esclerose Múltipla foi quem resolveu sair do armário, também, para dar o ar da sua graça e me deixar toda travada, na verdadeira acepção do termo.
Senti tanta rigidez nas minhas articulações nesses dias gelados, senti dores muito intensas nas pernas e dificuldades para me movimentar. De verdade, senti como se estivesse com os membros congelados, mesmo estando aquecida e protegida do frio intenso. Tudo estralava, tive a sensação de que estava ficando crocante, tal o barulho que minhas articulações têm feito nesses dias de baixas temperaturas.
Por tudo isso, vou dizer algo que nunca imaginei que falaria um dia na minha vida: que saudades do verão (rsrsrsrsrsrsrs)!

Beijos congelantes!

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Não apenas me veja... me enxergue!

Bete Tezine, Autorretrato.
Pintura digital sobre fotografia, 2013




Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos.

(Antoine De Saint-Exupéry)







Eu já disse, em alguns posts anteriores, que não possuo sequelas visíveis, mesmo tendo convivido tanto tempo com a Esclerose Múltipla sem qualquer tipo de tratamento, uma vez que o diagnóstico da sua presença em minha vida foi tardio.

Quem me vê, mas não me enxerga, não consegue detectar que carrego comigo uma doença degenerativa e incurável. 
Quem me olha, mas não me percebe, não vislumbra que caminho, lado-a-lado (isto porque não permito que ela passe à minha frente), com uma enfermidade imprevisível e geniosa como essa que compartilho com tantas outras pessoas mundo afora.
Quem não me desconhece, mas não me conhece, não entende os meus momentos de esgotamento profundo e completamente debilitante.
Porém, o fato de o mundo, quase que inteiro, não ver o que a Esclerose Múltipla provoca no meu corpo, mente e emoções, não a torna invisível a mim e àqueles que sabem exatamente quem e como eu sou. 
Eu ando, eu enxergo, eu escuto, eu penso, eu observo, eu falo, eu vivo... faço tudo isso e muitas outras coisas da forma que a minha companheira de vida permite. Algumas vezes eu não lhe dou ouvidos e, por se sentir ultrajada em seu poder de controle, ela se vinga no dia seguinte e me deixa, literalmente, entregue aos seus caprichos. Outras vezes, eu obedeço aos limites impostos por ela e, ela, feliz por se ver obedecida, me dá trégua e me permite, ligeiramente, esquecer da sua presença em minha vida, se transformando em quase sombra, silenciosa e  praticamente adormecida.
Meu corpo não a mostra a olho nu. Meu corpo não demonstra as dores, as parestesias, as espasticidades, os choques elétricos, a falta de força, os medos, as ansiedades, a fadiga debilitante aos que não enxergam através do que só é possível ver com olhos de quem sabe ver.
Eu tenho Esclerose Múltipla, sim, e isso é um fato imutável. Não vou melhorar me autoaplicando o Rebif, ela não vai desaparecer se eu fingir que ela não existe, ela não vai sair da minha vida da mesma forma que entrou, inesperada e silenciosamente.
Portanto, não me falem que eu vou me livrar da fadiga e das dores e de toda a gama de sintomas que ela provoca em mim, por melhores que sejam as intenções. Terei dias bons, dias não tão bons, dias ruins, dias melhores, dias piores, mas, em todos eles, a minha companheira indigesta estará ligada, irremediavelmente e irreversivelmente a mim e, isso, não é falta de fé, como já ouvi diversas vezes, não é pessimismo, como já ouvi também, é apenas realismo e aceitação, o que não significa que deixarei de lutar até o fim para ficar o melhor possível, dentro do que é possível sendo portadora de uma doença autoimune, progressiva, degenerativa e incurável.

Um beijo visível aos olhos do coração!

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Ah! O amor...

O amor tem feito coisas
Que até mesmo Deus duvida
Bete Tezine, Autorretrato.
Pintura digital sobre fotografia, 2013.
Já curou desenganados
Já fechou tanta ferida

O amor junta os pedaços
Quando um coração se quebra
Mesmo que seja de aço
Mesmo que seja de pedra
Fica tão cicatrizado
Que ninguém diz que é colado

Foi assim que fez em mim
Foi assim que fez em nós

Esse amor iluminado

(Ivan Lins/Vitor Martins)

Certa vez, assisti uma palestra que falava do amor ao próximo, cuja fala do palestrante começou da seguinte forma:

" Conta a lenda que havia um jovem muito rico que resolveu que doaria toda sua fortuna aos pobres, caso alguém lhe explicasse todo o conteúdo da Bíblia no tempo em que ele conseguisse ficar de pé apoiado em uma única perna. Tendo decidido isso, o jovem foi até um mosteiro, se dirigiu ao primeiro monge que encontrou, e lhe fez a proposta. O monge olhou bem para o jovem e disse-lhe que a Bíblia era muito extensa e, explicar todo o seu significado, naquele curto espaço de tempo, era completamente impossível. O jovem ficou triste, mas, não desistiu, se dirigiu ao próximo monge que encontrou e recebeu dele a mesma resposta. E, assim, tendo insistido sucessivamente, não encontrou ninguém disposto, ao menos, a tentar lhe dar a explicação que ele tanto ansiava. No entanto, apesar de já estar quase sem esperanças, o jovem resolveu se dirigir a um monge bastante idoso que estava sentado no fundo do mosteiro e, se colocando em frente a ele, fez a mesma proposta que havia feito aos demais monges anteriormente. Ao ouvir as palavras do moço, o monge olhou bem em seus olhos e disse-lhe: coloque-se em posição que lhe explicarei. O moço, entusiasmado, apoiou-se sobre uma perna e aguardou que o monge iniciasse a explicação. Após alguns segundos, o monge falou a palavra amor e se calou. O jovem, tendo ouvido, continuou sobre uma única perna à espera do restante da explicação que não veio. Quando não suportou mais, saiu da posição e perguntou ao monge porque ele havia se calado após ter dito uma única palavra e ele, olhando mais uma vez nos olhos do jovem rico, lhe falou que todos os ensinamentos da Bíblia podiam ser resumidos em amor, tão somente, amor. Ouvindo isso, o jovem se deu por satisfeito, se retirou do mosteiro e cumpriu a promessa que havia feito."

Hoje, não sei dizer bem o por quê, mas essa narrativa ficou rondando minha mente durante o dia inteiro e eu me pus a pensar no que o amor é capaz de fazer na vida de cada um de nós.
O amor é a linguagem universal, o idioma que todos entendem sem grandes explicações. 
O amor salva vidas, o amor restitui, engrandece, resgata e transforma. Por amor, nos tornamos grandes em atitudes, em coragem, em força para enfrentar qualquer tipo de dificuldade ou obstáculo imposto pela vida.
É por amor que nos transformamos, de pequenos, quase insignificantes, em gigantes. Ganhamos a força que nunca imaginávamos que teríamos e nos levantamos de situações inacreditáveis aos olhos daqueles que ainda não encontraram o verdadeiro amor.
Amar é vida. Amar é querer viver mesmo que nada demonstre ser possível que a vida prevaleça dentro de nós.
Por isso, ame, ame sem pensar, ame sem reservas, ame muito, não ame pouco, ame sem medo, ame intensamente, ame incondicionalmente, ame, simplesmente ame e verá que tudo pode se transformar pelo milagre do amor.

Beijos de alguém que ama demais!

terça-feira, 2 de julho de 2013

Olhando-se no espelho...






Sábio é o ser humano que tem coragem de ir diante do espelho da sua alma para reconhecer seus erros e fracassos e utilizá-los para plantar as mais belas sementes no terreno de sua inteligência.


(Augusto Cury)





Logo quando iniciei o blog e passei a compartilhar minhas escleroses, não apenas a Múltipla, mas todas as que carrego comigo como pessoa, comecei, também, a publicar meus textos em grupos de portadores de Esclerose Múltipla nas redes sociais. 
Como já escrevi algumas vezes, minha escrita é um autorretrato meu, posto que ela reflete, exatamente,  meu estado de espírito no momento em que derramo minhas palavras sobre as teclas do meu notebook. Eu não consigo e, na verdade, nem tento escrever sobre luz quando meu dia está escuro. Se o sol não adentrou pela minha janela naquele dia, a luz também não se refletirá no que eu escrever, uma vez que não sei falar de amor, se meu coração está repleto de dor, como também não sei falar de dor, se meu coração está inundado de amor...
Eu sou assim e isso é o que faz de mim quem sou.
Então, voltando ao princípio das minhas publicações nos grupos de portadores, encontrei eco das minhas inquietações em um sem número de companheiros de luta. Porém, devo dizer que encontrei muito antagonismo também, sendo taxada, por diversas vezes, de depressiva, de inconveniente, por não esconder minhas frustrações, medos, incertezas, angústias, decepções, desilusões... 
Tanto é que, certa vez, travei um embate virtual com um membro de um dos grupos quando ele questionou a minha forma de lidar com as minhas emoções, transferindo para minha escrita e meus trabalhos artísticos a angústia de descobrir-me acometida pela Esclerose Múltipla. Durante a discussão que tivemos, percebi nele uma certa inquietação, pelo fato, talvez, de eu ter tido a coragem de expor publicamente os fantasmas que me rondam, falando abertamente da minha insegurança, enquanto ele passava o dia inteiro publicando mensagens que falavam que a vida era maravilhosa, que tudo valia a pena, que o céu estava azul, que o mundo era lindo e outras coisas do gênero. Não que eu não veja mérito nisso, muito pelo contrário, é sempre fortalecedor ler mensagens que nos estimulam a não desistir da batalha diária. No entanto, ninguém está bem 100% do tempo, muito menos nós que carregamos conosco uma enfermidade imprevisível e caprichosa quanto a nossa companheira de vida.
Esse  senhor atingiu seu ápice quando me disse que eu não tinha como falar, com tanta propriedade, sobre ser esclerosada, pelo fato de eu ter menos de 1 ano de diagnóstico na ocasião. Nessa fala dele eu percebi, nitidamente, que eu havia me transformado em um espelho para ele, uma vez que o incômodo que eu lhe causava se devia ao fato de que eu, com muito menos tempo de diagnóstico, pois ele já havia sido diagnosticado há mais de 10 anos, segundo informação dele próprio, tinha a coragem de escancarar as janelas da minha alma para deixar antever toda a gama de emoções que a descoberta da nomenclatura do mal que me afligia, por mais de 15 anos, provocou em mim, ao passo que ele se escondia atrás de uma máscara de constante bem estar e felicidade com medo de assumir, para ele mesmo, o temor que sentia na própria pele. Não sei dizer o que aconteceu com ele, só sei que ele não faz mais parte de nenhum dos grupos dos quais participo, talvez por não se sentir a vontade de me ter por perto, mesmo que virtualmente. 
Eu tenho plena consciência de que eu, realmente, não sei nada, ou quase nada, sobre muitas coisas da vida, no entanto, apesar de não saber seu nome e nem antever sua face, por vários e vários anos tenho carregado, dependurada em mim, esta "mala sem alça" da Esclerose Múltipla, tempo suficiente para que eu possa falar do que se passa no meu interior por tê-la como companheira inseparável. 
Não sou a dona da razão e nunca pretendi ser. Não detenho a verdade e jamais deterei, pois a verdade não pertence a ninguém, uma vez que ela depende do ponto de vista e das vivências de cada um. Assim, meu diagnóstico é recente, no entanto, minha caminhada ao longo da estrada de males que me rodeavam feito um fantasma, me dão a certeza de que eu tenho alguma propriedade para falar do que é viver dia-a-dia como portadora de Esclerose Múltipla e, principalmente, como um exemplar da raça humana.

Um beijo espelhado...