terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Quando negam um direito seu...


Não queremos ser diferentes, e, sim, que todo mundo tenha o direito de ser como é.


(Renato Russo)


Fonte: Google imagens

Sabe aquele dia em que você acorda e, sair da cama, se torna uma batalha quase invencível de tantas dores, fadiga, fraqueza que você adquiriu durante o sono? Pode parecer ironia, mas é bem assim mesmo, vamos dormir razoavelmente bem e acordamos exauridos, como se tivéssemos disputado uma prova de triatlo durante o sono. Esclerosados vão na contramão de "uma boa noite de sono é capaz de restaurar as energias do corpo". É deprimente, lamentável, mas a mais pura realidade.
Pois bem, voltando à indagação inicial, quem de nós que vive acompanhado pela Esclerose Múltipla nunca acordou assim? Devo dizer que isso faz parte da minha rotina há tanto tempo que, por diversas vezes antes do diagnóstico, eu disse a mim mesma que só podia estar muito doente, tamanha a falta de energia que me dominava ao despertar.
Hoje, foi um desses dias em que acordei com tanta dor que tive de recorrer às muletas para conseguir ir ao banheiro. O banho foi uma luta da qual quase sai vencida, pois a fadiga, a falta de força nos braços me fizeram adiar a lavagem dos cabelos e ficar quase inerte embaixo do chuveiro. Me vestir, me pentear, me maquiar foi outro cabo de guerra, pois eu insistia de um lado, a Esclerose me puxava pro outro, por fim, consegui após muitas pausas, completamente ofegante, ficar apresentável para sair de casa.
Eu ainda não estou completamente recuperada da fratura no tornozelo e o surto de final de primavera enfraqueceu e causou ainda mais dores nas minhas pernas, motivo pelo qual, mesmo ingerindo analgésicos fortes, preciso de apoio para andar. Assim, lá fui eu, mancando, as pernas instáveis, apoiada na bengala, até um posto de atendimento do meu plano de saúde buscar autorização para fazer Ressonância magnética de crânio. 
Chegando lá, me deram uma senha normal. Então, educadamente, pedi à recepcionista que a trocasse, pois eu precisava de senha preferencial, afinal, só de olhar para mim dava para constatar que eu apresentava deficiência física naquele momento.  No entanto, ela sem levantar a cabeça, perguntou: por que precisa de senha preferencial, você é gestante? Eu respirei fundo e respondi: não, eu não sou, mas tenho Esclerose Múltipla, uma das doenças que me dá direito ao atendimento preferencial, sobremaneira no estado em que estou hoje. Sem  ao menos olhar na minha cara, ela simplesmente me disse: não interessa seu diagnóstico, você não tem direito à senha preferencial. Eu contei até dez e respondi: nunca ninguém me barrou no atendimento preferencial aqui, na verdade, nem em outro local qualquer, então eu vou retirar a senha preferencial e vou ser atendida, mesmo que para isso eu precise chamar a polícia. Ao ouvir isso, um rapaz que estava ao lado dela trocou minha senha e me pediu para aguardar.
Meu dia que já não tinha começado bem, conseguiu ficar um pouco pior. A recepção estava lotada, o ar condicionado não dando conta do calor, minhas pernas começando a formigar e um nó sem tamanho na garganta. Eu me senti muito mal naquele instante por ter de brigar por um direito meu, justamente em um dia em que a Esclerose Múltipla estava visível aos olhos de qualquer um... bastava olhar para mim e ver que eu tinha o direito de ser atendida preferencialmente.
Me senti tão pequena, tão insignificante, os olhares voltados para mim, as pessoas cochichando baixinho... eu normalmente não me abato por coisas desse tipo, na verdade, tiro de letra, costumo ir até o fim para ter um direito meu assegurado, todavia, em dias como o de hoje, em que as lágrimas ficam esperando para cair, em que as dores tiranizam meu corpo e minha alma, eu me sinto sem energia, quase desisto, mas daí arrumo forças, levanto a cabeça e exijo o que a lei me garante.
Por fim, fui atendida e relatei à supervisora de plantão o ocorrido e espero, sinceramente, que ninguém depois disso passe pelo mesmo  constrangimento que eu sofri quando necessitar usar os serviços daquele local.

Beijos fadigados, doloridos e acalorados!


Um comentário:

  1. A sua descrição do acordar bem podia ser a minha. Muito bom puder encontrar aqui o seu testemunho. Muito força e felicidades!

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