quinta-feira, 1 de maio de 2014

Aparências...




Não me julgue pelo o que aparento ser, pois as aparências enganam, de verdadeiro só o que há dentro de mim.


(Mila Peixotto)





No dia em que recebi o diagnóstico de esclerosada, minha neurologista me disse para correr atrás de todos os direitos que a lei me garantia a fim de me assegurar um pouco menos de desconforto ou estresse, como por exemplo fazer o cartão de estacionamento em vagas preferenciais. Ainda me lembro exatamente das palavras dela naquele dia: "você não tem sequelas visíveis, mas ninguém sabe o que é para você andar um quarteirão inteiro em um dia de sol".
Assim, fui atrás do cartão e não tive problema algum para conseguir.
No entanto, vez ou outra recebo alguns olhares atravessados, outras vezes sou questionada se tenho direito a usar a vaga, mesmo com o cartão colocado sobre o painel do meu carro estacionado. Porém, semana passada, ao estacionar na vaga preferencial de um supermercado, quando desci do carro, um senhor me mediu de cima a baixo e disparou esta pergunta: 
- Por acaso você é paraplégica para usar esta vaga?
Ao ouvir isso, parei, respirei fundo, dei meia volta, abri o carro, peguei meu cartão, calmamente abri minha carteira, peguei meu RG e mostrei ao tal cidadão que eu realmente tinha direito de usar a vaga, ao que ele respondeu:
- Você não parece que tem qualquer tipo de deficiência física, não!
Nesse ponto, eu, que estava tendo um dia pós-Rebif, com muita dor e fadiga extrema, virei para o cidadão e disse:
- Nem todas as deficiências físicas podem ser enxergadas pelos olhos, ademais pelos olhos de determinados tipos de pessoas.
Ao ouvir isso, o cidadão disse o seguinte:
- Desculpe então o incômodo é que você realmente não parece ter qualquer tipo de deficiência.
Eu respondi:
- Use essa situação como exemplo para nunca mais questionar alguém cuja deficiência você não pode enxergar.
Ele baixou a cabeça e saiu de perto de mim.
Eu entrei no supermercado me sentindo um ser de outro planeta por ter uma enfermidade que me extenua, me consome, me desabilita a realizar várias tarefas, mas que aos olhares dos outros aparento não ter absolutamente nada. 
Têm dias em que tiro isso de letra, que levo com bom humor, até brinco com a minha situação de esclerosada, porém, em outros eu me sinto mal, me deixo abater com comentários do tipo: "você não parece ter nada, parece até muito saudável, diga-se de passagem", pois só eu e os meus companheiros de enfermidade sabem exatamente a dimensão de carregar a Esclerose Múltipla como bagagem.
Quisera realmente sermos tão saudáveis quanto nossa aparência muitas vezes demonstra... Quisera que minhas pernas não fraquejassem quando preciso andar um pouco mais, subir escadas ou ficar de pé por alguns minutos... Quisera não precisar lançar mão dos benefícios que a lei me garante por ter uma doença grave... Quisera não ser esclerosada...

Beijos fadigados...

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