domingo, 11 de maio de 2014

Meu presente...


Carol e eu, 2014.

Sexta-feira, 09 de maio, por volta das 17 h o carteiro deixa em minha casa um envelope, escrito a mão, endereçado a mim. 
Pego o envelope, já estranhando de antemão receber uma carta que não seja boletos de contas a pagar, propagandas ou outras coisas do gênero, viro-o e leio o remetente: Ana Carolina Tezine, minha filha. 
Observo com mais atenção o envelope e, além do endereçamento de praxe, vejo um diamante e corações desenhados e, também, frases escritas: "Mãe, minha rainha",  "I love you" e "Ela é guerreira, é uma deusa, é uma mulher de verdade".
Neste momento, meu coração já pressente que o conteúdo do envelope irá provocar fortes emoções e as lágrimas ameaçam rolar dos olhos.
Com as mãos trêmulas, abro o envelope, retiro uma folha caprichosamente dobrada, desdobro-a, olho a letra tão familiar aos meus olhos e, com o coração aos saltos, começo a seguinte leitura:

"Santo André, 06 de maio de 2014.

"Mãe... quem dera se, por um descuido, Deus te fizesse eterna."

Mãe,

Tenho tanta coisa para te agradecer, tanta coisa para te falar que nem sei por onde começar.
Nenhum de nós é filho de chocadeira. Todos nós tivemos como primeira morada o ventre materno. Mãe, me desculpa por não ser a filha que você sempre sonhou e por não te encher de orgulho com notas boas na escola. Me desculpa por bagunçar, por te deixar preocupada quase sempre e por surtar às vezes. É, eu fico revoltada quando você não me deixa sair, mas depois eu entendo que não é porque você quer me prender, é porque você se preocupa comigo, mesmo errada nunca fui malcriada. Mãe, desculpe por te encher de preocupação quando eu estava zoando atrás de diversão. Me desculpe por te deixar furiosa comigo quando eu faço alguma bagunça. Eu estou crescendo, mãe. Quero te agradecer por brigar comigo. Sim, agradecer. Às  vezes eu preciso de alguém para me colocar na linha. Fiquei muito triste quando você descobriu a doença, achei que você não me amava mais porque começou a cuidar mais de si mesma. 
Mãe, eu rezo e peço pra Deus cuidar, a sua vida abençoar, vou correr por você até o fim. Eu sei que pra você também sou alguém que te faz tão bem como você faz para mim. No momento em que cortaram o cordão umbilical, nossos corpos foram separados, mas nossas almas estão ligadas até depois do fim. Desculpa ter ficado desse jeito, sempre vou guardar esse amor do lado esquerdo do peito.
Desculpa mãe por cada situação. Ilzabete é o nome do meu coração. Sou filha de uma guerreira, heroína e trabalhadora. Ainda vou te colocar dentro de um castelo e aposentar tua vassoura. Obrigada por ter me feito o que sou, sem você eu não seria metade. Independente de onde eu vou, o meu sentimento por você não mudará. Sempre estarei ao seu lado. Você segurou minha vida, quando eu estiver no topo, você estará acima. O tempo está passando e eu estou crescendo, você é minha proteção. eu ainda vou te dar uma casa pra você fazer uma festa e calar a boca das velhas que falavam "ela não presta". Eu nunca acreditei em superstição, mas sempre desvirei o chinelo. Eu juro que vou tomar juízo. Mãe, nada na minha vida é mais importante que você. Eu te amo."

Terminei a leitura da carta com as lágrimas enuviando meus olhos, os soluços escapando da garganta e um orgulho sem tamanho da minha menina que está crescendo, crescendo mais rápido do que meu coração pede...
Eu a abracei demoradamente, a beijei com imensa ternura e agradeci por ela ser minha filha e por me dar um amor incondicional, um carinho incomparável e uma amizade extrema.
Esse foi, sem dúvida alguma, meu maior presente do dia das mães...

Feliz dia das mães para todas as mães do mundo!

Beijos emocionados no coração de todos!

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Aparências...




Não me julgue pelo o que aparento ser, pois as aparências enganam, de verdadeiro só o que há dentro de mim.


(Mila Peixotto)





No dia em que recebi o diagnóstico de esclerosada, minha neurologista me disse para correr atrás de todos os direitos que a lei me garantia a fim de me assegurar um pouco menos de desconforto ou estresse, como por exemplo fazer o cartão de estacionamento em vagas preferenciais. Ainda me lembro exatamente das palavras dela naquele dia: "você não tem sequelas visíveis, mas ninguém sabe o que é para você andar um quarteirão inteiro em um dia de sol".
Assim, fui atrás do cartão e não tive problema algum para conseguir.
No entanto, vez ou outra recebo alguns olhares atravessados, outras vezes sou questionada se tenho direito a usar a vaga, mesmo com o cartão colocado sobre o painel do meu carro estacionado. Porém, semana passada, ao estacionar na vaga preferencial de um supermercado, quando desci do carro, um senhor me mediu de cima a baixo e disparou esta pergunta: 
- Por acaso você é paraplégica para usar esta vaga?
Ao ouvir isso, parei, respirei fundo, dei meia volta, abri o carro, peguei meu cartão, calmamente abri minha carteira, peguei meu RG e mostrei ao tal cidadão que eu realmente tinha direito de usar a vaga, ao que ele respondeu:
- Você não parece que tem qualquer tipo de deficiência física, não!
Nesse ponto, eu, que estava tendo um dia pós-Rebif, com muita dor e fadiga extrema, virei para o cidadão e disse:
- Nem todas as deficiências físicas podem ser enxergadas pelos olhos, ademais pelos olhos de determinados tipos de pessoas.
Ao ouvir isso, o cidadão disse o seguinte:
- Desculpe então o incômodo é que você realmente não parece ter qualquer tipo de deficiência.
Eu respondi:
- Use essa situação como exemplo para nunca mais questionar alguém cuja deficiência você não pode enxergar.
Ele baixou a cabeça e saiu de perto de mim.
Eu entrei no supermercado me sentindo um ser de outro planeta por ter uma enfermidade que me extenua, me consome, me desabilita a realizar várias tarefas, mas que aos olhares dos outros aparento não ter absolutamente nada. 
Têm dias em que tiro isso de letra, que levo com bom humor, até brinco com a minha situação de esclerosada, porém, em outros eu me sinto mal, me deixo abater com comentários do tipo: "você não parece ter nada, parece até muito saudável, diga-se de passagem", pois só eu e os meus companheiros de enfermidade sabem exatamente a dimensão de carregar a Esclerose Múltipla como bagagem.
Quisera realmente sermos tão saudáveis quanto nossa aparência muitas vezes demonstra... Quisera que minhas pernas não fraquejassem quando preciso andar um pouco mais, subir escadas ou ficar de pé por alguns minutos... Quisera não precisar lançar mão dos benefícios que a lei me garante por ter uma doença grave... Quisera não ser esclerosada...

Beijos fadigados...