terça-feira, 15 de abril de 2014

Inutilidade...

Os homens estimam-vos conforme a vossa utilidade, sem terem em conta o vosso valor. 

(Honoré de Balzac)



Um dos maiores medos, senão o maior de todos, que carrego comigo, é o medo de ficar dependente fisicamente. Não é a primeira vez que falo isso e, com certeza, não será a última.
Eu sempre quis, mesmo que contrariando a própria natureza das coisas, ser útil àqueles que, de uma forma ou de outra, fazem ou fizeram parte da minha vida. Sempre tive medo de ser um peso morto. Sempre quis fazer a diferença na  vida daqueles que quero bem. Sempre busquei uma real utilidade na minha presença aonde quer que eu fosse.
Todavia, infelizmente, hoje me vi nas palavras do Pe. Fábio de Melo ao assistir o vídeo que coloquei no começo deste post, quando ele disse que a utilidade é algo muito perigoso. Ele tem razão no que disse e eu senti isso na própria pele por muitas e muitas vezes... 
Quantas vezes imaginei que era amada, que gostavam de mim, que sentiam minha falta, quando na verdade o que fazia falta era a utilidade que eu tinha na vida de uma ou outra pessoa. Gostavam dos favores que eu prestava, gostavam da minha forma de nunca dizer não, gostavam da minha constante disponibilidade, gostavam da minha afabilidade, gostavam de eu ser sempre prestativa, gostavam de tudo, menos verdadeiramente de mim.
Agora, esclerosada, estou sentindo, mais latente do que nunca, o receio de um dia me tornar inútil, de me tornar alguém que precise de alguém para realizar a maior parte das atividades rotineiras, de não poder mais cuidar de mim mesma sozinha, nem de ajudar os que precisam de mim e, isso, antes mesmo de envelhecer. O fantasma da dependência me ronda, me espreita, me bota medo, me assusta, porque eu não serei mais útil, não terei mais utilidade, serei inútil caso ele me alcance com suas garras gélidas e implacáveis. E dai, como será?
Serei descartada da vida daqueles a quem não posso mais ter alguma utilidade? Serei deixada de lado porque não poderei mais estar disponível quando de mim necessitarem? Serei esquecida em um canto qualquer das lembranças daqueles a quem um dia eu pude acolher, ajudar, amparar? Isso me assusta, me assusta demais...
O Padre fala de amor, do amor que acolhe a inutilidade daqueles a quem se ama incondicionalmente, mas às vezes nem o amor é suficiente para garantir que o "inútil" seja acolhido, muitas vezes não resta ninguém, restam os asilos, as casas de repouso, o desprezo, o desamor...
De verdade, não sei do meu futuro, ou melhor, ninguém sabe, mas hoje eu sei que mesmo que minhas pernas parem de funcionar, que meus braços deixem de abraçar, que meus olhos não possam mais ver o colorido da vida, mesmo que eu me torne completamente inútil, existirão pessoas, talvez muito poucas, bem poucas mesmo, que olharão dentro dos meus olhos e dirão, conforme falou o Pe. Fábio de Melo, você não serve mais pra nada, mas não vivemos sem você!


Bete Tezine


quinta-feira, 3 de abril de 2014

Outro grito de revolta...

Seringas das minhas aplicações do Rebif


- Parabéns pra mim, e minha fúria, minha revolta e meu ataque de 5 minutos foi eterno enquanto durou...

(Ghraa Macedo)






Me descobri esclerosada há exatos 792 dias e há 732 dias iniciei o uso do Rebif.
Contando com a que me apliquei ontem, foram 341 injeções, ou seja, 341 picadas, 341 hematomas e 341 dias seguintes às aplicações em que, com raras exceções, fui dominada pelos efeitos colaterais que me deixam, em dias como o de hoje, bem revoltada com a Esclerose Múltipla, a verdadeira responsável por tantas injeções e mal estar.
Eu sei que minha jornada ao lado dessa companheira indigesta está apenas começando em relação aos que a têm em suas vidas há muito mais tempo que eu. Perto dos que já perderam as contas de quantas picadas levaram, as minhas 341 representam um número ínfimo, quase insignificante. No entanto, hoje as reações estão tão acentuadas, que só me restou registrar o meu grito de revolta, mais uma vez, contra essa dependência medicamentosa e malvada a qual a bipolar da Esclerose Múltipla me obrigou.
Hoje estou, de novo, exaurida...
A dor de cabeça não passa, a fadiga me extenua, o nariz congestionado e ardendo como se estive com uma baita de uma gripe, as pernas pesadas, enfim, estou me sentindo verdadeiramente doente. 
É, hoje estou doente e, para quem é esclerosado, devia ser proibido adoecer de qualquer outra enfermidade. Ser esclerosado já basta, não necessitamos de nenhum outro mal a nos afligir, pois a Esclerose Múltipla já se encarrega de nos causar males suficientes para nos deixar verdadeiramente adoecidos por toda uma vida.
Hoje, eu não querida, não queria mesmo, mas estou tão dolorida, que todo o bom humor se esvai, que o choro rola fácil, que a tolerância fica próxima do zero e que a vontade de não ser esclerosada fica tão latente que chega a doer dentro de mim.
Hoje, o que me conforta é saber que às quintas-feiras não tenho injeção para me aplicar e, por conta disso, a sexta-feira tem grande probabilidade de amanhecer mais colorida diante dos meus olhos menos doloridos e embaçados. Normalmente às sexta-feiras não sinto tanta dor e isso é o que me anima um pouco em dias como o de hoje.
Amanhã é um novo dia, um dia que não é pós-Rebif. Que bom!

Beijos no coração de todos!